Assembleia Legislativa discute políticas públicas aos povos indígenas
Municipalização da saúde, demarcação e proteção dos territórios, reforço na educação, e fomento à produção agrícola em discussão.
Para discutir as políticas públicas de fomento aos povos indígenas no Estado de Rondônia, a Assembleia Legislativa realizou na tarde desta segunda-feira (18), audiência pública, proposta pelo deputado estadual José Lebrão (MDB), reunindo autoridades e lideranças dos povos indígenas.
Na abertura da audiência, Lebrão disse que o momento é fundamental para a discussão das políticas públicas para os povos indígenas. "Temos leis que resguardam os direitos dos povos indígenas, mas há uma deficiência na garantia desses direitos. Temos que garantir recursos para que as políticas se concretizem e atendam as comunidades indígenas".
Lebrão defendeu a participação dos povos indígenas nas discussões, levando a sua realidade para o conhecimento da sociedade. "Quero deixar o registro, em nome da Comissão de Direitos Humanos, a qual presido nesta Casa, de que iremos ouvir as comunidades menos desassistidas, e buscar soluções para suas demandas", completou.
O presidente da Assembleia Legislativa, Laerte Gomes (PSDB) e os deputados estaduais Ismael Crispin (PSB), Cássia Muleta (Podemos) e Chiquinho da Emater (PSB), participaram da audiência pública, além do deputado federal Mauro Nazif (PSB).
"Esta Casa assume o papel de ser interlocutora e mediadora de ações importantes como esta. As políticas públicas precisam ser mais presentes, se adequando à realidade de cada comunidade indígena. Mas, não adianta apenas criar ações isoladas, é preciso um trabalho mais completo. Por exemplo, não adianta criar uma alternativa de renda nas aldeias, sem que tenha estradas para levar essa produção", ressaltou Laerte.
Ações
O presidente disse que a Assembleia vai ser um canal aberto de diálogo com essas comunidades. "Estamos à disposição para contribuir e trabalharmos no sentido de garantir o acesso dos povos indígenas aos seus direitos, dentro das nossas responsabilidades enquanto parlamentares".
Ismael Crispin iniciou suas considerações tratando da Medida Provisória 870, que tem gerado preocupação entre as lideranças indígenas de Rondônia, que já enfrentam desafios como a demarcação e a garantia de suas terras, a cada dia mais cobiçadas por invasores.
"É bom ouvir a comunidade indígena, mas também ouvir a propositura do Governo para os povos indígenas. Devemos debater o fomento à produção, mas também a questão da saúde, que a União quer transferir para os municípios, e da educação, que apesar dos avanços nos últimos anos, ainda há muito a ser feito para a melhoria do setor", destacou o deputado.
Crispin manifestou a necessidade de se criar um órgão próprio para tratar da questão indígena. "Isso não pode ficar só no discurso, mas sim na prática. A inclusão no PPA, que será debatido neste ano, de ações ligadas às comunidades indígenas, precisa avançar".
Chiquinho da Emater também defendeu que sejam incluídas no PPA ações para os povos indígenas, assegurando recursos orçamentários. "Também defendo o fortalecimento das agroindústrias nas comunidades indígenas. Quero colocar emendas minhas para as aldeias, para o fomento à produção", assegurou.
Desmonte
Mauro Nazif ressaltou a importância de se discutir a questão indígena, mas alertou que a Medida Provisória 870, que tramita no Congresso Nacional, deixa a causa dos povos indígenas sem um norte.
"A Funai só existe em razão dos indígenas. A coisa, como quer a União, está sendo fracionada. A estrutura da Funai está no Ministério da Justiça, as ações da Funai no Ministério das Mulheres e da Família; a demarcação das terras no Ministério da Agricultura. Olha aonde foi cair a demarcação, logo onde se tem menos interesse na demarcação e isso nos preocupa", desabafou.
O parlamentar informou que apresentou duas emendas, para que a Funai fique no Ministério da Justiça, com as atribuições de demarcação e ações voltando a ficar sob a responsabilidade da Funai. "Essa discussão aqui na Assembleia é muito importante e se soma a esse esforço. Outro ponto alarmante é que querem botar a saúde indígena aos municípios, sendo que a maioria deles mal consegue dar conta de sua saúde básica".
Respeito
Representando o deputado estadual Lazinho da Fetagro (PT), que cumpria agenda no interior do Estado, Mariton Holanda, enfatizou que na Constituição de 1988 os direitos dos povos indígenas estão assegurados. "O desafio é lutar contra o retrocesso, contra a supressão de direitos dos povos indígenas. As demarcações devem voltar para o comando da Funai. Temos que respeitar as culturas das comunidades indígenas e proteger as suas terras. O Estado pode ajudar a zelar por seus territórios", destacou.
Avanços
O coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI), João Cavalcante, pontuou que estão sendo registrados avanços na saúde indígena, e informou a chegada de médicos brasileiros, formados no exterior, que começam a trabalhar no próximo dia 27.
"Estamos valorizando os indígenas, com médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e farmacêuticos oriundos das aldeias. Temos uma cota, determinada em lei, que está sendo cumprida. É preciso se organizar, pois os deputados manifestaram interesse em apoiar, mas para isso é preciso garantir as entidades legalizadas", observou.
O coordenador regional da Funai em Guajará-Mirim, que abriga cerca de seis mil índios, de 25 etnias, João Soares Rodrigues, destacou a importância da iniciativa da audiência e destacou que os povos indígenas são de responsabilidade, não apenas da União, mas também dos Governos estaduais e municipais. "O Estado pode cooperar, e muito, com o desenvolvimento desses povos. Estamos entabulando um termo de cooperação com a Emater, nesse momento, para o apoio técnico à agricultura dos povos indígenas", observou.
João Soares disse ainda que "a Constituição reconhece que o índio é um cidadão com plenos direitos, mas ainda sofre para ter seus direitos respeitados. Com esta abertura, surge aqui uma coisa maravilhosa, pois somos cidadãos e temos que aproveitar e discutir, ações ligadas à educação, saúde, infraestrutura e outras".
Direitos
O coordenador da União das Nações Povos Indígenas de Rondônia, Noroeste de Mato Grosso e Sul do Amazonas (Cunpir), Heliton Gavião, iniciou a sua fala reconhecendo a importância das discussões, mas observou que os temas de interesse dos indígenas, nem sempre estão em pauta nos Legislativos brasileiros.
"Que a Assembleia abrace a causa indígena, com ações efetivas nas mais diversas áreas. O momento é de esquecer o discurso histórico de discriminação dos povos indígenas e que os nossos direitos, como cidadãos brasileiros, sejam respeitados e contemplados. Temos que estar na pauta dos debates e não mais ignorados. Esta audiência mostra um lado positivo desse Parlamento", destacou.
Helinton acrescentou que "essa discussão não pode parar por aqui, mas estar presente sempre nas pautas importantes desta Casa, para que os nossos direitos, as nossas necessidades tenham uma atenção, um carinho especial".
Henrique Suruí, líder de sua etnia, ressaltou que os povos Suruí e Tupari, colocaram Rondônia no cenário nacional, como produtores de café de excelente qualidade. "O povo Suruí produz café desde a década de 1980.
"Peço que a Assembleia ou Governo, crie uma lei específica para garantir o desenvolvimento econômico dentro da terra indígena. Também precisamos garantir os territórios não-demarcados e, principalmente, respeitar a cultura indígena. Neste momento, é urgente retirar os invasores de terras indígenas. Para garantir a nossa terra, a nossa casa e os direitos respeitados. Nos preocupa também a municipalização da saúde indígena e a educação precisa ser reforçada, para garantir qualidade para os nossos alunos", argumentou.
O defensor público Guilherme Luís de Ornelas Silva observou que a Defensoria sempre tem a sua atuação pautada pela defesa dos direitos humanos. "A Defensoria quer ser um acesso também dos povos indígenas aos seus direitos".
Tenda da família
O secretário de Assistência Social e da Família de Porto Velho, Claudinaldo Leão da Rocha, representando a Prefeitura da capital, informou que após uma visita à aldeia Karitiana, surgiu a ideia da "Tenda da Família Indígena", que será concretizada nos próximos dias. "Quero firmar esse compromisso, para que possamos levar esses serviços para as comunidades indígenas, em razão das dificuldades de deslocamento dessas famílias para a cidade para retirar documentos. Esse é o nosso compromisso".
Edjales Benício, representando a Associação Kanindé, registrou a importância das discussões. "Junto com a Cunpir, o Governo já realizou um trabalho com as comunidades indígenas para uma política estadual dos povos indígenas. Essa minuta poderia ser resgatada e trazida às discussões. Por outro lado, seria importante acompanhar a implementação da política pública de Governança Climática, aprovada no final do ano passado, que especifica a garantia da salvaguarda dos povos indígenas", completou.
O diretor do Departamento Rural da Subsecretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento (Semagric), Luís Carlos Menezes, se colocou à disposição para trabalhar em parceria com as comunidades indígenas, no fortalecimento da agricultura. "Entre os dez melhores produtores de café do país, tivemos produtores indígenas de Rondônia. Ou seja, podemos fazer muito mais com parcerias".
Outras lideranças indígenas se manifestaram, defendendo o fim da MP 870, denunciando a invasão de terras indígenas, alertando para a mineração em áreas indígenas, e criticando o repasse aos municípios a saúde nas aldeias.
Encaminhamentos
A criação de uma Frente Parlamentar para discutir temas como o ICMS ecológico, uma política estadual de desenvolvimento sustentável dos povos indígenas, além da defesa dos direitos das comunidades indígenas e a discussão de aporte financeiro, via emendas, para as aldeias, foram alguns dos encaminhamentos.
"Avançamos em muitas discussões e a audiência pública, a primeira realizada nesta Legislatura, cumpre o seu papel. Queremos seguir contribuindo com o debate sobre os direitos dos povos indígenas e fortalecendo a luta", finalizou.
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