Burrice nacional

Para o economista e ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, "há certos erros que, além de demonstrar subserviência nacional, são sinal também de burrice – burrice nacional. É o caso da privatização de serviços públicos monopolistas". Um exemplo recente é o saneamento básico

Luiz Carlos Bresser-Pereira
Publicada em 12 de julho de 2020 às 11:36

(Foto: Câmara | Senado | Reuters)

Certos erros que as nações e seus governos cometem são motivados pela arrogância e pelo imperialismo, como foi o caso da Alemanha ao declarar a Segunda Guerra Mundial, ou dos Estados Unidos ao fazerem a Guerra do Iraque em 2003. Erros que foram também sinal de incompetência dos governantes.

Outros erros decorrem da dependência do país em relação ao país hegemônico, associados também a incompetência, como foi o caso de toda América Latina ao fazer sua abertura comercial em 1990 ignorando que as tarifas alfandegárias eram um mecanismo de neutralização da doença holandesa.

Mas há certos erros que, além de demonstrar subserviência nacional, são sinal também de burrice – burrice nacional. É o caso da privatização de serviços públicos monopolistas. Como foi a privatização das empresas de produção e distribuição de energia elétrica, das empresas de estradas de rodagem, da telefonia fixa, e, agora das empresas de saneamento básico.

As duas tolices usadas como argumento são que o Estado não tem recursos para financiar os investimentos necessários e que as empresas estatais são por definição ineficientes. Ora, quando acontecem as privatizações, o que vemos é ser o financiamento dos novos investimentos ser realizado pelo BNDES.

Quanto à “necessária” ineficiência das empresas estatais, a burrice nacional fica absolutamente transparente quando vemos empresas estatais de outros países comprarem nossas empresas, ou então o governo dos outros países subsidiarem suas empresas para que comprem nossas empresas.

Depois de privatizadas, vemos as empresas geralmente não realizarem no prazo os investimentos a que se comprometeram. Em lugar disso, o que vemos são aumentos de preço. 

A empresa privada só é eficiente porque é controlada pela competição no mercado. As empresas de serviços públicos são monopolistas. Aqueles que as compram nada arriscam, não são empresários, são rentistas. Aqueles que aceitam sua privatização são burros a serviço de espertos.

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

Professor emérito da Fundação Getúlio Vargas onde pesquisa e ensina teoria econômica e teoria política desde 1959. Foi Ministro da Fazenda (1987) e Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado (1995-98). É doutor honoris causae pela Universidade de Buenos Aires

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