Casa onde adolescente foi morto tem 72 marcas de tiros, diz entidade
Informação é da organização Rio da Paz
João Pedro Mattos Pinto | Foto: reprodução/Twitter
A casa onde o adolescente João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, foi morto na segunda-feira (18), está com 72 marcas de tiro. João Pedro foi atingido durante uma operação policial no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro. A informação é da organização não governamental Rio de Paz, que mandou representantes ao local para prestar assistência à família.
O articulador social da entidade, João Luis Silva, acompanhou o sepultamento e, logo após, foi até a casa onde filmou e contou as marcas nas paredes internas da casa. Ele também diz que os parentes do menino relataram diversas irregularidades na ação policial.
“Logo após o sepultamento, nós fomos com parentes e líderes comunitário ver em que estado ficou a casa depois dessa operação desastrosa. Tivemos acesso à residência e nos foi informado que a perícia tinha sido feita na hora. Eu contei 72 buracos. Entre buracos na janela da sala, na parede da sala, na parede do quarto, e também buracos em um outro cômodo que fica fora da casa. E um disparo acertou a TV”.
Inquérito
A Polícia Civil informou que a Corregedoria Geral da corporação instaurou sindicância administrativa disciplinar “para apurar a conduta dos policiais civis que participaram da ação no Complexo do Salgueiro”.
A corporação informou que o inquérito para apurar a morte de João Pedro, “ferido durante operação da Polícia Federal com apoio da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core)”, foi instaurada pela Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DHNSGI).
“Foi realizada perícia no local e testemunhas prestaram depoimento na delegacia. Os policiais já foram ouvidos e as armas apreendidas para confronto balístico. O piloto do helicóptero prestará depoimento e familiares também serão ouvidos. Os laudos periciais estão sendo analisados e outras diligências estão sendo realizadas para esclarecer as circunstâncias do fato”.
A Polícia Federal, que participava da operação no Salgueiro com a Polícia Civil, informou que não vai se manifestar sobre a questão, já que “há investigação em curso na Polícia Civil para apurar o fato”.
Operação
O objetivo da operação conjunta da Polícia Civil e da Polícia Federal era cumprir dois mandados de busca e apreensão contra lideranças de uma facção criminosa em São Gonçalo. Segundo o relato de moradores do local, a casa é do avô de João Pedro e reunia no momento da ação policial seis crianças e adolescentes, sendo João Pedro um dos mais velhos. Elas jogavam sinuca no quintal quando ouviram a aproximação de um helicóptero e disparos de armas de fogo, indo se refugiar dentro de casa. Quando os policiais entraram na casa disparando, os jovens começaram a pedir ajuda pelo telefone, pelo WhatsApp.
Após ser atingido, João Pedro foi levado pelos policiais de carro, com o auxílio de um primo do menino, e depois transportado de helicóptero. Ele só foi localizado pela família por volta das 4h de ontem (19) já no IML, sem registro da passagem dele por nenhum hospital. A ação ocorreu na tarde de segunda.
Denúncia à ONU
O assassinato de João Pedro foi denunciado à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA) pela deputada estadual Renata Souza (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), junto com o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ).
A denúncia envolve também a morte de pelo menos 12 pessoas em uma operação no Complexo do Alemão, zona norte do Rio de Janeiro, na sexta-feira (15).
Repercussão
A Anistia Internacional Brasil e Justiça Global, em conjunto com o Coletivo Papo Reto de comunicação comunitária, com sede no Complexo do Alemão, divulgaram uma nota conjunta em que condenam as operações policiais ocorridas no Alemão e no Complexo do Salgueiro.
As entidades cobram explicações do Governo do Estado do Rio de Janeiro e do Ministério Público Estadual sobre as operações no contexto da pandemia de covid-19, que, segundo a nota, prejudicam as medidas de proteção dos moradores das favelas nesse período de isolamento social e as atividades humanitárias emergenciais como a distribuição de cestas básicas para os mais necessitados.
“Exigimos que as polícias adotem os mesmos parâmetros de atuação em todos os territórios do Estado e das cidades e só realize operações quando tiverem a total garantia de que as vidas de todos e todas os moradores estejam protegidas. Exigimos também que os agentes do Estado, que podem ser veículos de transmissão da covid-19, tomem as medidas necessárias para a proteção da saúde e da vida dos moradores das comunidades”, disse a nota.
Procurados, o governo do estado e o Ministério Público Estadual, não se manifestaram sobre a nota conjunta, até a publicação desta matéria.
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