CCJ aprova projeto com medidas contra a corrupção e abuso de autoridade
O texto segue para votação no Plenário.
O relator da proposta, Rodrigo Pacheco, apresenta seu relatório na reunião da Comissão de Constituição e Justiça desta quarta-feira Pedro França/Agência Senado
Após duas horas e meia de discussão, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou nesta quarta-feira (26) o projeto de lei de iniciativa popular conhecido como Dez Medidas contra a Corrupção, que prevê também a criminalização do abuso de autoridade cometido por magistrados e membros do Ministério Público (PLC 27/2017). O texto segue para votação no Plenário.
Apresentado ao Congresso pelo Ministério Público Federal em 2016, o texto passou pela Câmara dos Deputados com modificações — entre elas, a inclusão de medidas contra o abuso de autoridade por parte de juízes e procuradores, tema que concentrou a maior parte das falas dos senadores durante a reunião desta quarta. A CCJ rejeitou, em votação simbólica, um pedido para que os pontos que tratam do abuso de autoridade fossem retirados do relatório do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
O relator da proposta apresentou durante a reunião seu parecer com novas mudanças, mas ressaltou que o cerne do projeto está mantido: a criação do crime de caixa dois e o aumento de pena para crime de corrupção, tornando-o hediondo em alguns casos. Rodrigo Pacheco afirmou que ouviu procuradores e juízes para elaborar um relatório equilibrado.
— O que nós estamos fazendo prever de maneira clara e definitiva é a criação de dois tipos penais: a criminalização do caixa dois eleitoral e a criminalização da compra de votos em processo eleitoral. E, em relação ao abuso de autoridade, do projeto que veio da Câmara, fazemos inserir fundamentalmente dois dispositivos absolutamente fundamentais para garantir o exercício livre por parte de magistrados e membros do Ministério Público: a previsão expressa de que, para a caracterização do abuso de autoridade, é preciso que haja comprovado o dolo específico, o fim especial de agir para se beneficiar, para prejudicar outrem, ou por capricho pessoal ou por satisfação pessoal; e, segundo, a proibição do crime de interpretação, do crime de hermenêutica — argumentou.
Abuso de autoridade
Entre as condutas que podem passar a ser criminalizadas para magistrados, estão a de proferir julgamento mesmo se for impedido por lei específica e a de atuar com motivação político-partidária. A pena prevista é de detenção de seis meses a dois anos e multa.
Já para o membro do Ministério Público, a proposta estabelece que serão crimes de abuso de autoridade emitir parecer mesmo se alguma lei o impedir e atuar com motivação político-partidária. A pena prevista também é de detenção de seis meses a dois anos e multa.
Rodrigo Pacheco manteve os dispositivos que endurecem as punições a juízes e promotores por abuso de suas funções, mas explicitou que as condutas descritas no projeto só representarão crime de abuso de autoridade se forem praticadas para “prejudicar” ou “beneficiar” a outros ou a si mesmo, ou quando eles agirem comprovadamente “por mero capricho ou satisfação pessoal”.
Além disso, a modificação do relator destaca que a simples divergência na interpretação da lei ou na análise de fatos e provas não deverá configurar, por si só, prática criminosa, afastando a possibilidade do chamado “crime de hermenêutica”.
Outra emenda busca retomar um dispositivo do texto original que foi removido pela Câmara: a ação civil de extinção de domínio, instrumento que seria usado para reaver bens conquistados de forma ilícita mesmo sem a responsabilização penal dos indivíduos.
Emendas
Nesta quarta-feira, o senador apresentou um complemento de seu relatório para analisar outras emendas apresentadas após a leitura do documento, no dia 12. Foram sugeridas cerca de 40 emendas ao projeto, incluindo algumas apresentadas oralmente durante a reunião. Entre outras mudanças acatadas de última hora, está a previsão de não criminalizar como abuso de autoridade a opinião externada por membros do MP e de magistrados, salvo quando haja “dolo específico do abuso de autoridade”, que deve ser praticado com a finalidade de “prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, para satisfação pessoal ou por mero capricho”.
Ele também acatou parte das novas emendas para retirar do texto a menção a outras condutas que poderiam ser classificadas como abuso de autoridade.
A nova redação suprimiu trechos do texto que veio da Câmara relacionados à “atuação desidiosa” (desempenhar as atividades profissionais com preguiça, agir com negligência, desleixo, desatenção) de magistrados e membros do MP. De acordo com o relator, a criminalização dessas condutas é incoerente. Ele também suprimiu a criminalização de condutas incompatíveis com a honra e o decoro, pela mesma razão. Para Pacheco, essas atitudes devem ter consequências meramente administrativas, sem o emprego de reprimenda penal.
OAB
Rodrigo Pacheco acolheu também emenda para suprimir trecho do projeto que daria legitimidade à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a organizações da sociedade civil constituídas há mais de um ano para o oferecimento de queixa em ação penal nos crimes de abuso de autoridade contra membros do Ministério Público e do Poder Judiciário.
“A OAB pode requerer, mas não requisitar a instauração de inquérito”, destacou.
Pena
O senador acatou emenda que estabelece a substituição da reclusão por detenção, que não admite que o início do cumprimento seja no regime fechado, para uma série de crimes previstos no projeto para combater o abuso de autoridade.
“A restrição de liberdade estipulada nesses dispositivos é de seis meses a dois anos, não havendo razão para se prever o cumprimento de pena inicialmente em regime fechado, dada a incidência predominante da regra do artigo 44 do Código Penal, que impõe a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos”, apontou.
Avanço
Para Marcos Rogério (DEM-RO), o projeto avança no combate à corrupção e não afeta juízes e promotores que agem conforme a lei. Ele destacou que o relator teve cautela ao acatar emendas que evitam o constrangimento de agentes no cumprimento de seu dever legal.
— Andou bem o relator do presente PLC, senador Rodrigo Pacheco, na manutenção do artigo 15 do projeto, que trata de caixa dois eleitoral. Além disso, faço questão de registrar a manutenção no PLC do artigo 16, o qual inclui alguns crimes contra a administração pública no rol de crimes hediondos, endurecimento de pena de verdade, para valer, medida importante para o combate à corrupção. O bom juiz e o bom promotor não devem se preocupar com o crime de abuso de poder — disse.
Major Olimpio (PSL-SP) avaliou que a redação final dada pela CCJ reforça o enfrentamento à corrupção e não pode ser considerada uma retaliação à Operação Lava Jato.
— Mais de 90% do conteúdo se refere ao pacote anticrime, ao esforço contra a corrupção e aos crimes contra a administração pública. Nem o Senado nem a CCJ estão em um esforço de votar o abuso de autoridade para constranger membro do Ministério Público ou da magistratura — reforçou.
Mecias de Jesus (PRB-RR) e Esperidião Amin (PP-SC) consideram que a criminalização do abuso de autoridade é também uma forma de combate à corrupção.
— Uma das formas mais sutis de corrupção é o exercício continuado da autoridade e seus cacoetes. É o caso daquele que tem autoridade não avaliar a consequência do que faz — apontou Esperidião Amin.
Críticas
Na contramão, alguns senadores defenderam a discussão em separado das medidas contra corrupção e do abuso de autoridade. O senador Lasier Martins (Podemos-RS) foi um dos que propôs a retirada dos artigos 8º e 9º do projeto, itens que tratam de abuso de autoridade. Para ele, as matérias são “jabutis” estranhos ao projeto de iniciativa popular. Ele ressaltou que o Senado já aprovou projeto sobre abuso de autoridade em 2017 — o PLS 85/2017, que foi remetido à Câmara dos Deputados e ganhou novo número (PL 7.596/2017). Para Lasier, o PLC 27 é uma tentativa de intimidar juízes e promotores da Lava Jato.
— Dois milhões de brasileiros assinaram esse projeto de lei para combater a corrupção no auge daquela euforia que foi um marco estabelecido pela Lava Jato. Houve desvirtuamento do projeto de lei de iniciativa popular. O que se quer aqui é intimidar juízes e promotores. Em vez de punições administrativas, aqui se quer criminalizar as condutas — criticou.
Assim como Lasier, Juíza Selma (PSL-MT) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) anunciaram que votariam contra o projeto, se mantido o trecho sobre abuso de autoridade. Eles avaliaram que o parecer do relator é um avanço em relação à Câmara dos Deputados, mas criticaram a inclusão do abuso de autoridade no projeto de combate à corrupção.
— Se pudermos separar as duas coisas (abuso de autoridade e corrupção), eu votaria a favor. Isso passaria uma mensagem clara à população — defendeu Oriovisto.
Na mesma linha, Alessandro Vieira (Cidadania-SE) avaliou que é importante um projeto que puna o abuso de autoridade, mas considerou inadequado inserir o texto no projeto sobre combate à corrupção.
Mordaça
Questionado pelo senador Jorge Kajuru (PSB-GO) se o projeto, mesmo com as alterações, seria uma “mordaça” a magistrados e membros do MP, pois passaria a ser crime a emissão de opinião por parte de magistrados e procuradores ou promotores de Justiça por meios de comunicação, Rodrigo Pacheco negou a tentativa de impedir a manifestação de juízes e promotores.
— Acrescentei dois dispositivos fundamentais: a exigência de que este fato seja complementando pelo dolo específico de quem o pratica para atingir outra pessoa ou beneficiar a si próprio. Este texto é exatamente como o que existe como punição disciplinar de juiz — respondeu.
Venda de voto e caixa dois
Entre outros pontos, o projeto altera o Código Eleitoral (Lei 4.737, de 1965) para explicitar que o eleitor comete crime ao negociar ou tentar negociar seu voto em troca de dinheiro ou outra vantagem. A pena prevista é de reclusão de um a quatro anos e multa. O crime de caixa dois eleitoral também está previsto, com pena de dois a cinco anos e multa. Qualquer arrecadação, recebimento ou gasto de candidato ou administrador financeiro que for feita “paralelamente à contabilidade exigida pela lei eleitoral” poderá ser enquadrado.
Histórico
O projeto de lei das Dez Medidas contra a Corrupção foi formulado pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e, depois de uma campanha de coleta de assinaturas, foi apresentado em como uma proposta de iniciativa popular (PL 4.850/2016).
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