Direito ao esquecimento relativiza avaliação de antecedentes baseada em condenação de 25 anos atrás
O réu havia sido condenado em 1991 a seis meses de detenção por posse de drogas para uso próprio, ainda sob a antiga Lei das Drogas.
O ministro Rogerio Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), aplicou excepcionalmente o direito ao esquecimento em um caso de condenação por tráfico de drogas e reduziu a pena imposta ao réu, de sete para cinco anos de reclusão, ao afastar a avaliação de maus antecedentes decorrente de uma condenação por posse de drogas que transitou em julgado em 1991.
O réu havia sido condenado em 1991 a seis meses de detenção por posse de drogas para uso próprio, ainda sob a antiga Lei das Drogas. Em 2015, foi preso novamente com 22 gramas de cocaína e acabou condenado no ano seguinte a sete anos de reclusão. O juízo de primeiro grau utilizou a condenação ocorrida 25 anos antes como motivo para não conceder a redução de pena prevista no artigo 33, parágrafo 4º, da atual Lei de Drogas.
Segundo o ministro, é preciso levar em conta as particularidades do caso e considerar que durante o transcurso desses 25 anos o réu não voltou a delinquir; portanto, “deve ser relativizado o único registro anterior do acusado, tão antigo, de modo a não lhe imprimir o excessivo relevo que pretenderam as instâncias ordinárias”.
Schietti citou teoria de Samuel Warren e Louis Brandeis sobre o direito ao esquecimento, adotado na esfera civil, e afirmou que a essência da teoria, com as devidas adaptações e temperamentos, também pode ser aplicada no âmbito criminal.
“Com efeito, não se pode tornar perpétua a valoração negativa dos antecedentes, nem perenizar o estigma de criminoso para fins de aplicação da reprimenda, sob pena de violação da regra geral que permeia o sistema. Afinal, a transitoriedade é consectário natural da ordem das coisas. Se o transcurso do tempo impede que condenações anteriores configurem reincidência, esse mesmo fundamento – o lapso temporal – deve ser sopesado na análise das condenações geradoras, em tese, de maus antecedentes”, declarou o ministro.
Precedentes
Rogerio Schietti salientou que sua decisão não implica dizer que o mero decurso de tempo baste para impedir que fatos pretéritos sejam considerados na avaliação de antecedentes. No entanto – esclareceu –, “eternizar a valoração negativa dos antecedentes sem nenhuma ponderação sobre as circunstâncias do caso concreto não se coaduna com o direito penal do fato”.
O relator lembrou que o STJ possui entendimento de que as condenações prévias, com trânsito em julgado há mais de cinco anos, apesar de não ensejarem reincidência, podem servir de alicerce para valoração desfavorável dos antecedentes. Entretanto, decisões no STJ e também no Supremo Tribunal Federal (STF) relativizam a existência desses maus antecedentes para fins de dosimetria da pena em casos excepcionais.
Schietti lembrou que está em pauta no STF o julgamento, sob o rito da repercussão geral, de um recurso que decidirá se deve haver ou não prazo limite para se sopesar uma condenação anterior como maus antecedentes.
Na decisão, o ministro reduziu a pena-base para o mínimo legal (cinco anos), já que todas as outras circunstâncias judiciais do réu, exceto os antecedentes, foram consideradas favoráveis no processo, e determinou o retorno dos autos ao juízo responsável para a análise do eventual preenchimento dos demais requisitos necessários ao benefício do artigo 33, parágrafo 4º, da Lei das Drogas: não se dedicar a atividades delituosas nem integrar organização criminosa. Leia a decisão.
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