Era “tradição do nosso carnaval o Galo na quinta-feira“

O título é trecho de uma marchinha do bloco Galo da Meia Noite, entoada por 25 anos em Porto Velho.

Luciana Oliveira - http://blogdalucianaoliveira.com.br
Publicada em 10 de janeiro de 2018 às 21:25
Era “tradição do nosso carnaval o Galo na quinta-feira“

http://blogdalucianaoliveira.com.brNeste fevereiro o bairro Caiari não verá o desfile do segundo mais antigo e maior bloco carnavalesco da capital por causa de dívidas com o município.

Em 2017 o Galo desfilou por força de liminar e por boa vontade do prefeito rolou uma renegociação para quitar os débitos, mas foi impossível honrar o parcelamento.

Não se discute o dever da prefeitura em cobrar, nem se impede o choro com a ausência do bloco que tem um dos mais ricos acervos de marchinhas com fatos e personagens históricos do carnaval da capital.

O silêncio no terreiro do Galo será como uma marcha fúnebre.

O preço que o antigo ‘bloco de sujo’ com essência popular paga por se transformar num ‘superbloco’ é a morte.

Como o Galo, muitos blocos símbolos da nossa tradição momesca foram apagados do calendário cultural.

A burocracia para ocupar as vias públicas e a cobrança de taxas e impostos condenaram à morte blocos tradicionais, sem distinção.

E muito por culpa da desgraçada Lei que regulamentou eventos de grande porte que em seu Art. 1º sacramenta: “A promoção e realização de eventos de grande porte, com ou sem finalidade lucrativa, em espaços públicos ou privados, ficam condicionadas às disposições presentes nesta Lei.”

É importante destacar que muitos só conseguiram manter os desfiles com a pouca venda de camisetas/abadás, pois o apoio financeiro do poder público nunca foi perene.

Houve sempre mais intenção em atrapalhar que ajudar a manter as manifestações carnavalescas. A compensação social dos eventos populares vem sendo desprezada por uma arrecadação sem importância.

A renúncia a tão baixos valores deve ser admitida com um investimento, afinal, é de cultura que estamos falando.

O que fazer para que o poder público exerça seu dever constitucional de fomento à cultura para que patrimônios como o Galo não desapareçam?

O que sugiro é a isenção de taxas e impostos a quem promover atividades sem fins lucrativos relacionadas ao carnaval, como fazem as escolas de samba, blocos carnavalescos ou folclóricos, trios elétricos e semelhantes. Com garantia de apoio financeiro, claro.

Tanto é possível e vantajoso que o ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, fez.

Fernando Haddad, que o sucedeu, também ampliou o fomento à cultura quando liberou as escolas de samba de São Paulo de pagarem aluguel pelo uso de áreas públicas e garantiu a anistia das dívidas com IPTU.

Os blocos tradicionais que ofertam a chamada ‘folia barata’ foram cadastrados e se multiplicaram. O carnaval de rua de São Paulo foi o que mais cresceu nos últimos anos, bem como o retorno financeiro com a festa.

Que tal um vereador meter a cara pra propor e o prefeito demonstrar vontade política em garantir aprovação?

Por mim, o Galo retorna às suas origens, não vende nada e garante apoio da prefeitura daqui pra frente.

Quanto mais carnaval democrático com a chancela do poder público, melhor.

É inaceitável que um bloco de valor cultural deixe de existir, porque nem com a venda de camisetas consegue arcar com os custos para desfilar.

Quem quiser seguir comercializando camisetas que o faça, mas também sem regras que sugerem perseguição. Que seja menos pesada a burocracia, que aliviem na cobrança de taxas e impostos a quem vende pra poucos e garante acesso a milhares na festa.

“Com abadá, sem abadá, não importa”, todos aproveitam numa “onda que nem pororoca”.

Será muito triste não ver o desfile do Galo, sobretudo porque suas marchinhas serão executadas em praticamente todos os blocos.

Quando as orquestras tocarem o ‘Último Regresso’, é dele que vou lembrar.

“Não deixem não, que o bloco campeão,
guarde no peito a dor de não cantar.
Um bloco a mais é um sonho que se faz
o pastoril da vida singular.”

Comentários

  • 1
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    Alcides Camelo 10/01/2018

    É certo que carnaval é cultura e deve ser incentivado pelo poder público. No entanto, penso que o poder público, ou melhor, os gestores públicos devem ter responsabilidade e sabedoria para distinguir o que é prioridade entre cultura e saúde, cultura e educação,... O que não acho conveniente é destinar parte das escassas verbas públicas para incentivar carnaval que, diga-se de passagem, é uma atividade cultural que agrada uma percentagem muito pequena da população, enquanto pessoas estão morrendo por falta de atendimento nas unidades de saúde, dadas as deficiências de toda ordem do setor. Aliás, é exatamente nesse período de carnaval que os problemas na saúde pública se agravam com o aumento significativo de pessoas que dão entrada nos hospitais públicos em decorrência de "acidentes" que ocorrem nessa época. É como diz o ditado: Quem não pode com o pote, não pega na rodia. Se os organizadores do citado Bloco ou de qualq

  • 2
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    José Roberto Cardoso 10/01/2018

    Também lamentarei a ausência do Galo, que não "cantará" pelas ruas da Capital no próximo período de Carnaval. Porém, o poder público não deixa de ter razão, quando exige certas providências por parte dos organizadores de tais eventos momescos, notadamente daqueles que arrastam multidões às ruas. Primeiramente, estes organizadores sempre tentam obter generosas doações de dinheiro público, para a organização da festa. Depois vem a necessidade de se colocar nas ruas da Capital um oneroso e grande aparato policial, para que o cidadão não veja a cidade sendo invadida por hordas de vândalos, arruaceiros, brigões, bêbados, assaltantes e outros malfeitores, os quais sempre conseguem providenciar mais trabalho para Delegacias, Postos de Saúde e Hospitais. E por último, sobra para a Prefeitura dar um jeito para limpar a cidade, emporcalhada pela multidão que participa desses EVENTOS CULTURAIS... Cultura??? Há controvérsias. Assim sendo, acho que a promoção de eventos pseudo-culturais, por pessoas que sempre lucram com venda de camisetas, recebimento de repasses de verba pública, entre outros, deve ser, efetivamente, controlada e regulamentada. Os tempos são outros. Os bincantes nem sempre são aqueles dos saudosos tempos antigos, a alegria e boa educação da multidão é coisa do passado e hoje costuma não trazer cultura e lazer a todos. Novos tempos, novas leis.

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