Estado de Rondônia é condenado a indenizar agente penitenciário por danos morais

Conforme o processo, o agente teria desobedecido ordem para proceder a revista das celas; consequentemente, foi chamado pelo coronel PM para esclarecer a suposta insubordinação e acabou sendo levado à força a uma delegacia de polícia

Assessoria
Publicada em 10 de agosto de 2019 às 11:28
Estado de Rondônia é condenado a indenizar agente penitenciário por danos morais

O juízo  1ª Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública condenou o Estado de Rondônia a pagar indenização,  por danos morais, a favor do agente penitenciário Vanderson Brito da Silva, no valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais).

No dia 29 de janeiro deste ano, o agente foi conduzido à força  para uma delegacia de polícia para autuação por suposto crime de desobediência, por determinação de um coronel durante a intervenção da Polícia Militar nos presídios do Estado, no período do movimento grevista dos servidores penitenciários.

Conforme o processo, o agente teria desobedecido  ordem para proceder a revista das celas.  Consequentemente, foi chamado pelo coronel para  esclarecer a suposta insubordinação. Ao não atender, foi conduzido para a delegacia por ordem do  militar. 

A defesa de Vanderson Brito construiu a tese jurídica de que o coronel praticou abuso de autoridade, porque,  em caso de eventual falta disciplinar, deveria ser instaurado PAD (Processo Administrativo Disciplinar) e concedido prazo de defesa. Sustentou  ainda que o agente foi submetido à situação vexatória e de constrangimento na  frente dos colegas e teve sua liberdade restringida.

O juízo da  1ª Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública do TJ julgou o caso e entendeu que “na medida em que é incontroverso no processo que a parte requerente foi coagida a apresentar-se imediatamente perante o coronel interventor por suposta infração disciplinar e também acabou sendo conduzida coercitivamente (ainda que de forma moral) para uma delegacia de polícia, não resta dúvida de que foi vítima de abuso de direito e ato ilícito que acarretaram dano moral”. 

Segue trecho da decisão:

É conceito básico de Direito Penal que nulum crimem sine praevia legem, ou seja, não há crime sem prévia lei que o estabeleça. Daí serem marcos para o Direito Penal brasileiro o princípio da legalidade e da anterioridade. Num. 29687108 - Pág. 1 Quando se faz essa referência a lei é no sentido estrito, ou seja, do ato normativo cujo rol de competência da Constituição Federal estabelece ser o meio pelo qual sejam enunciados os tipos penais. Nesse sentido, a lei necessária para criação de crimes é a ordinária federal, de modo que um decreto estadual não pode estabelecer que uma infração disciplinar torne-se crime durante um período de intervenção em presídio. 

É a inteligência do art. 22, I, da Carta Magna. Art. 22.

 Compete privativamente à União legislar sobre: 

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

 Assim sendo, o modo de agir estabelecido pelo próprio ente estatal é claramente inconstitucional, de modo que existem duas situações geradoras de responsabilidade civil. A primeira que é o abuso de direito do governador do estado de Rondônia que excede os limites constitucionais a sua atuação e dos servidores que estão sob sua subordinação, bem como a ilicitude da conduta do coronel interventor que diante de regra nitidamente inconstitucional tinha o deve de abster-se de aplicá-la, o que afasta a hipótese de estrito cumprimento de um dever legal.

Registro também que a um servidor civil (agente penitenciário) não se aplicam as normas castrenses, pois o decreto também não o torna um militar, mas apenas um civil provisoriamente subordinado a “coordenação” de uma estrutura militar. 

Quanto a como deveria ser o tratamento conferido a parte requerente, na medida em que fica afastada a hipótese de prática de crime (ao menos pelo que foi justificado pelo interventor), resta para enquadramento jurídico uma infração disciplinar em tese. 

Para todo e qualquer fato que possa ser enquadrado como infração disciplinar a lei complementar n° 68/92 determina que há dever do superior hierárquico de realizar “apuração imediata mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar” (art. 181). 

O art. 184 da mesma legislação determina que as provas sejam enviadas “ao Secretários de Estado ou titular do órgão a que pertence o servidor, o qual determinará a instauração imediata de sindicância, mediante portaria, anexando a esta a documentação referente a prova material da infração e decidirá a citação do sindicado para interrogatório no prazo de 03 (três) dias”. 

Observe-se que o governador não pode afastar a aplicação de uma lei complementar por decreto executivo, logo, diante da notícia de fato que configure supostamente uma infração disciplinar o interventor poderia, no máximo, agrupar as provas que estivessem em seu poder e assinar portaria para inaugurar uma sindicância. 

Também é digno de nota que não há previsão para aplicação de qualquer medida coercitiva de apresentação do servidor. Mais que isso o servidor tem o direito de ser interrogado com respeito ao prazo de 03 (três) dias. 

Na medida em que é incontroverso no processo que a parte requerente foi coagida a apresentar-se imediatamente perante o coronel interventor por suposta infração disciplinar e também acabou sendo conduzida coercitivamente (ainda que de forma moral) para uma delegacia de polícia não resta dúvida de que foi vítima de abuso de direito e ato ilícito que acarretaram dano moral.


Processo Número: 7007179-10.2019.8.22.0001

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