Estatuto do Idoso: 14 anos de prioridade e proteção a quem já passou dos 60

O direito de prioridade previsto no Estatuto do Idoso serviu de base para decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, em setembro de 2016, determinou que o estado de Rondônia incluísse uma pessoa idosa na lista de credores a serem contemplados com a antecipação do crédito humanitário, previsto no artigo 100, parágrafo 2º, da Constituição Federal.

STJ
Publicada em 02 de outubro de 2017 às 16:52
Estatuto do Idoso: 14 anos de prioridade e proteção a quem já passou dos 60

O Estatuto do Idoso completou  14 anos neste domingo (1º). Instituída para concretizar os preceitos da Constituição Federal em relação às pessoas maiores de 60 anos, a Lei 10.741/03 regula questões como atendimento prioritário, moradia, saúde, proteção contra tratamento discriminatório ou violento, assuntos trabalhistas e previdenciários e muitos outros.

O direito à prioridade está previsto no artigo 3º, parágrafo 1º, o qual detalha os casos em que os idosos terão precedência, não apenas no pagamento de precatórios, mas também em outras situações, como no atendimento em órgãos públicos e no recebimento da restituição do Imposto de Renda, por exemplo. O parágrafo 2º do mesmo artigo acrescenta que os idosos com idade acima de 80 anos terão prioridade em relação aos demais.

Crédito humanitário

O direito de prioridade previsto no Estatuto do Idoso serviu de base para decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, em setembro de 2016, determinou que o estado de Rondônia incluísse uma pessoa idosa na lista de credores a serem contemplados com a antecipação do crédito humanitário, previsto no artigo 100, parágrafo 2º, da Constituição Federal. O benefício é assegurado a credores maiores de 60 anos e a portadores de doenças graves, cujos créditos não ultrapassem o limite determinado legalmente.

O relator do caso, ministro Herman Benjamin, citou a Resolução 115/2000 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cujo artigo 12 estabelece que, para recebimento de créditos humanitários, “serão considerados idosos os credores originários de qualquer espécie de precatório, que contarem com 60 anos de idade ou mais na data de expedição do precatório em 9 de dezembro de 2009, data de promulgação da EC 62/2009, sendo também considerados idosos, após tal data, os credores originários de precatórios alimentares que contarem com 60 anos de idade ou mais, na data do requerimento expresso de sua condição, e que tenham requerido o benefício”.

Em seu voto, o ministro esclareceu que o pagamento de precatórios para idosos “se dá em respeito aos princípios da dignidade da pessoa humana e do direito à saúde, garantias fundamentais a todos os cidadãos” (RMS 49.539).

Caráter personalíssimo

Em julgado de fevereiro de 2014, os recorrentes alegaram ter direito de preferência no pagamento de precatório, nos mesmos termos do titular falecido, por serem herdeiros e também idosos.

Entretanto, nesse caso, o relator, ministro Humberto Martins, ressaltou o caráter personalíssimo desse direito. “O postulado direito de preferência no pagamento de precatórios não pode ser estendido, uma vez que possui caráter personalíssimo, tal como se infere dos dispositivos da Constituição Federal nos quais está previsto”, explicou (RMS 44.836).

Planos de saúde

Outra questão bastante discutida em relação aos idosos é a existência de abuso ou ilegalidade no aumento das mensalidades dos planos de saúde em razão de mudança de faixa etária.

Para coibir aumentos excessivos, a jurisprudência do STJ construiu critérios de aferição. Um deles é que o reajuste deve ter expressa previsão contratual; outro, que respeite as normas dos órgãos governamentais.

Além disso, segundo afirmou o ministro Villas Bôas Cueva ao analisar o recurso de uma cliente de plano de saúde em dezembro de 2016, não devem ser aplicados índices de reajuste “desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o consumidor, em manifesto confronto com a equidade e as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da especial proteção ao idoso, dado que aumentos excessivamente elevados, sobretudo para esta última categoria, poderão, de forma discriminatória, impossibilitar sua permanência no plano”.

Isso não significa, naturalmente, que os planos não possam reajustar as contraprestações dos beneficiários para assegurar seu equilíbrio econômico-financeiro, conforme esclareceu Villas Bôas Cueva ao examinar o caso concreto em julgamento.

“A norma do artigo 15, parágrafo 3º, da Lei 10.741/03, que veda ‘a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade’, apenas inibe o reajuste que consubstanciar discriminação desproporcional ao idoso, ou seja, aquele sem pertinência alguma com o incremento do risco assistencial acobertado pelo contrato”.

No caso julgado, segundo o relator, não ficou comprovada nenhuma política de preços desmedidos ou tentativa de impedir a consumidora de permanecer vinculada ao plano após atingir determinada idade, nem a adoção de índices excessivos ou discriminatórios (REsp 1.568.244).

Benefício assistencial

Em julgado de fevereiro de 2015, foi analisada questão relativa ao benefício assistencial previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), o qual só pode ser concedido perante comprovação da hipossuficiência do núcleo familiar.

Na ocasião, foi discutido se o benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deveria ser contabilizado na renda familiar para concessão do benefício assistencial, conforme estabelecido no artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, por analogia.

De acordo com o esclarecimento do relator, ministro Benedito Gonçalves, o benefício previdenciário não deve ser contabilizado nesses casos. “Em sede de incidente de uniformização de jurisprudência suscitado pelo INSS, a Terceira Seção passou a entender que o benefício previdenciário, no valor de um salário mínimo, recebido por maior de 65 anos, também deve ser afastado para fins de apuração da renda mensal per capita quando objetivada a concessão de benefício de prestação continuada”, esclareceu o relator (REsp 1.355.052).

Moradia

O direito do idoso a uma moradia também já foi tema de discussão em muitos recursos no STJ. Julgado de abril de 2012 tratou da impenhorabilidade do bem de família, destacando que a Constituição Federal e o Estatuto do Idoso conferiram à pessoa idosa todos os direitos fundamentais, incluindo “expectativa de moradia digna no seio da família natural” e situando o idoso, por conseguinte, “como parte integrante dessa família” – afirmou o relator, ministro Luis Felipe Salomão.

Ainda de acordo com a decisão, “a Lei 8.009/90 institui a impenhorabilidade do bem de família como um dos instrumentos de tutela do direito constitucional fundamental à moradia e, portanto, indispensável à composição de um mínimo existencial para a vida digna, sendo certo que o princípio da dignidade da pessoa humana constitui-se em um os baluartes da República Federativa do Brasil” (REsp 950.663).

Dívida tributária

Em outubro de 2008, outro julgado já havia considerado impenhorável o imóvel de um idoso que deixou de pagar contribuições de melhoria em razão de obras de pavimentação e por isso estava sofrendo execução fiscal por parte do município.

O imóvel chegou a ser objeto de penhora. Em primeira instância, o incidente de impenhorabilidade de bem de família foi julgado improcedente, decisão reformada pelo Tribunal de Justiça. O município entrou no STJ com recurso especial.

Para o relator, ministro Luiz Fux (hoje no Supremo Tribunal Federal), “as exceções à impenhorabilidade do bem de família, previstas no artigo 3º da Lei 8.009/90, devem ser interpretadas restritivamente, considerando a sistemática estabelecida pela lei, sendo certo que a ressalva da lei decorre de dívida do imóvel por contribuição de cota condominial e não contribuição de melhoria”.

Além disso, o ministro ressaltou a incidência do artigo 37 do Estatuto do Idoso, destacando o direito a uma moradia digna. O município havia alegado que o estatuto não serviria de desculpa para o não pagamento da dívida tributária, pois os valores se destinariam a toda a coletividade.

No entanto, segundo Luiz Fux, “o princípio da dignidade da pessoa humana, em especial do idoso, deve ser aqui aplicado no sentido de impedir qualquer restrição ao direito de moradia do recorrido. Assim, a exegese proposta coaduna-se com a dignidade humana que tutela o idoso, nos termos do artigo 37 da Lei 10.741/03” (REsp 873.224).

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