História de Rondônia: no governo do deputado Ângelo Angelim, Rondônia alcançou o seu primeiro milhão de habitantes
Na análise política, Angelim fora governador tampão, por administrar o estado no período entre a saída do último governador ainda nomeado pelo presidente, e a eleição de Jerônimo Santana em 1986, o primeiro pelo voto direto desde 1943*.
Governador Ângelo Angelim e Tomás Correia caminham; atrás, Jerônimo Santana e Orestes Muniz
Rondônia alcançou o primeiro milhão de habitantes durante gestão do governador Ângelo Angelim, entre 10 de maio de 1985 e 15 de março de 1987. O presidente eleito Tancredo Neves morreu em 21 de abril de 1985, o vice José Sarney substituiu-o, e um dos seus primeiros atos foi exonerar o governador Jorge Teixeira de Oliveira, nomeando Angelim para o cargo.
No advento da chamada Nova República, o compromisso alardeado era “probidade e competência”. Esse período teve início no final do regime militar em 1985, com a saída do general João Baptista de Oliveira Figueiredo da Presidência do Brasil e a entrada de um civil no cargo. Também é conhecida por Sexta República.
Na análise política, Angelim fora governador tampão, por administrar o estado no período entre a saída do último governador ainda nomeado pelo presidente, e a eleição de Jerônimo Santana em 1986, o primeiro pelo voto direto desde 1943*.
A indicação resultou de um consenso entre o PMDB e a Frente Liberal, lembra o jornalista Lúcio Albuquerque: “O nome de Angelim obteve aprovação do Senado Federal, embora tenha encontrado resistência de parlamentares que pretendiam o cargo, e de adversários políticos, entre eles o senador Odacir Soares (PDS)”.
A escolha resultara de um parto político a fórceps. Dois nomes disputavam a preferência dos parlamentares estaduais: os também deputados Amizael Silva e Amir Lando , mas prevaleceu Angelim, por indicação de Santana.
Renunciando à cadeira na Assembleia Legislativa, o professor assumiu o governo e apontou como prioridades o atendimento aos pequenos produtores agrícolas; investimento nas áreas de saúde, educação, energia elétrica e proteção ao meio ambiente; e a reivindicação ao governo federal para um tratamento diferenciado.
Rondônia acumulava problemas decorrentes da intensa migração para o estado e os problemas da fronteira brasileira com a Bolívia também lhe afetavam. Tanto que Angelim instalava em Guajará-Mirim o seu governo itinerante, ouvindo reivindicações. Em sua gestão foram criados os municípios de Alvorada d’Oeste, Alta Floresta d’Oeste e Santa Luzia d’Oeste.
Em 24 de julho de 1985 Angelim colocava a polícia civil no encalço dos assassinos do padre missionário Ezechielle Ramim (foto), da Congregação Comboniana**, morto numa tocaia na Fazenda Catuva, município de Aripuanã (MT). Depois de velado numa procissão pelas ruas de Cacoal, o corpo do padre foi enviado para Pádua (Itália) e sepultado pela família. Presos, os matadores do padre foram levados para a Penitenciária do Carumbé, em Cuiabá.
Segundo o padre comboniano Pedro Bracelli, a Comarca Cuiabá julgou dois processos. Condenado, um dos mandantes fugiu. Poucos meses depois da morte de Ezechielle houve um desafio entre colonos e fazendeiros, e um deles, Omar Pires Bruno, denunciado como responsável pelo assassinato, morreu numa emboscada, naquela fazenda.
A firmeza e o equilíbrio do secretário de segurança pública Raimundo Correia estavam em jogo pouco tempo depois disso: o governador Angelim teve que demiti-lo por haver autorizado atos de tortura que resultaram em morte de posseiros na Agropecuária Santa Julia, em Porto Velho, e noutra ocasião, por tumultuar um voo para Cuiabá, onde desembarcou embriagado e foi internado num hospital daquela Capital, de onde fugiu.
Em abril de 1986, o senador Odacir Soares, apoiado pelos senadores Galvão Modesto e Claudionor Roriz (todos do PDS), e por quase toda a bancada federal de Rondônia, acusou o governador de corrupção. Angelim não se descompatibilizou do cargo de governador no prazo estipulado [fevereiro de 1986], e assim deixou de concorrer nas eleições de novembro. Em 14 de março de 1987, passou o governo para Jerônimo Garcia de Santana, o primeiro governador eleito pelo voto direto desde 1943 (criação do Território Federal do Guaporé).
MIGRAÇÃO DESENFREADA, MALÁRIA E DESESTÍMULO
Entre janeiro e junho de 1984 haviam chegado mais 82 mil pessoas e até dezembro elas seriam 130 mil. Para assentar apenas um terço desse contingente, o governo estadual estimava investimentos de 12 bilhões de cruzeiros apenas para os projetos do Incra. Desse total, oito bilhões seriam consumidos pela abertura de estradas vicinais.
O inchaço desafiava o Incra, que foi responsável pela titulação de 3,4 milhões de hectares em Rondônia entre 1979 e 1983. Até junho de 1984 alcançavam-se mais 358,9 mil ha. Só se tornavam proprietários dessas terras os maiores de 21 anos.
O Núcleo Estadual Responsável por Migrações recebia do IBGE a confirmação da taxa de crescimento de 15,80% da população rondoniense, superando as médias de outros estados, especialmente os do Centro-Oeste.
A situação ficava delicada para o coordenador especial do Incra, Ernani Carvalho Coutinho, que defendia o direito constitucional de ir e vir. Os novos projetos eram a única saída, embora ele reconhecesse que a extensão de todos eles seria insuficiente para o assentamento desses migrantes.
Antigo seringal, Machadinho do Oeste virou cidade após a consolidação de um projeto do Incra. Chamava-se apenas Machadinho. Foi ali que se reencontraram os agricultores paranaenses Aristides Pivetta, 46 anos, e Severino Pereira da Silva, 42. Moravam vizinhos no Paraná.
Severino, pernambucano de Arcoverde, pai de sete filhos, morava em Jaru desde 1981. Não se deu bem no Paraná, onde trabalhava em lavouras de café. Aqui, obteve um lote de 50 ha, dos quais preparou sete com arroz, milho, feijão, banana, batata e café.
Aristides plantou cacau, mandioca e previu para mais tarde o cultivo de guaraná e grandes fruteiras. Vivia com o governo na cabeça e na ponta da língua:
– Não escondo de ninguém que me filiei ao PDS para conseguir esse lote mais rápido, com facilidade – confessava, sem disfarçar o riso. Alguns colonos vindos dos estados da Bahia, Minas Gerais e Espírito Santo também fizeram isso. PDS era a sigla do Partido Democrático Social, sucedâneo da Aliança Renovadora Nacional (Arena). Ambos apoiavam o governo.
“Ponta de lança da fronteira humana brasileira, onde não há nem a miséria do pessimismo nem a abundância proclamada pelos otimistas, o mais novo estado possui hoje cerca de um milhão de habitantes” – noticiava o Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro.
– Segurar essas pessoas quando elas estão prestes a realizar o seu sonho, não dá. É preciso orientá-la nas suas cidades de origem, antes de viajarem para Rondônia – opinava o então líder do PMDB na Assembléia Legislativa, Amir Lando.
O Incra dava o seu jeito, expedindo AOS (autorizações de ocupação), apesar de o Banco do Brasil e os bancos particulares – Bradesco e Bamerindus principalmente – penhorarem sucessivamente as terras de inadimplentes em Ji-Paraná, Ouro Preto do Oeste e Jaru.
Entristecidos, muitos agricultores não tinham dinheiro para pagar o financiamento agrícola. Quando via algum colono esperançoso demais, o motorista de ônibus da Eucatur, Eugênio Gonçalves, brincava:
– Tá chegando mais um iludido pra voltar um desesperado.
Contudo, essa recessão não desanimava o lavrador cearense João Roque Moreira, também oriundo da lida de um grande cafezal em Nova Aurora (PR). Corajoso, anteriormente ele percorrera os estados de Minas Gerais e São Paulo, com êxito. Mãos calejadas e com catarata (perda da transparência do cristalino) no olho direito, João Roque embarcaria num ônibus rumo a Ouro Preto, na BR-364. Buscava mais uma empreitada na vida, talvez a mais certeira.
Plantaria cacau para um nissei, depois receberia do Incra um lote no Projeto Urupá. Uma frase breve traduzia o seu contentamento:
– Estou me sentindo rico e já penso até que posso ser feliz.
O nome faz referência ao nascimento de um novo período democrático, em oposição ao antigo governo que representava a censura, falta de democracia e repressão aos movimentos sociais.
Mais tarde, em 2009, Angelim confessava algumas amarguras: “Além de desentendimentos com o deputado Jerônimo, a perseguição que afirmou ter sofrido de parte do Tribunal de Contas do Estado; e na disputa de 1990 pelo Senado, quando disse ter sido abandonado pelo então candidato Oswaldo Piana”.
Angelim assumia o cargo enfrentando um desafio: o Banco Mundial (BIRD) havia congelado US$ 200 milhões de financiamentos ao setor público em Mato Grosso e Rondônia.
Em Porto Velho, diversas obras de alcance social estavam paralisadas. Pefelistas [políticos do Partido da Frente Liberal] ligados ao então deputado Francisco Chiquilito Erse pleiteavam a metade das secretarias de governo.
O homem forte de Angelim foi seu cunhado, Francisco Ansiliero, chefe da Casa Civil, que em tudo interferia, notadamente na área educacional. Servidor do estado, em 1984 ele foi autorizado por decreto do governador Jorge Teixeira de Oliveira a viajar para Videira (SC), a fim de assessorar o plano de educação rural daquele município.
O governo mudou em meio a greves. O coronel Jorge Teixeira de Oliveira, Teixeirão, transmitia o cargo a Angelim em ato solene na sacada do Palácio Presidente Vargas, mas lá fora repercutiam algumas greves do funcionalismo público [13 mil servidores] que experimentava a redução de 50% em seus salários, em consequência do novo plano de reclassificação de cargos.
Com o presidente da Assembleia, deputado Amizael Silva, em ato no interior do estado
O HOMEM
Graduado em Letras, Filosofia e Administração de Empresa, ele era casado com Elisabeth Maria Ansiliero Angelim, com quem teve dois filhos.
Nomeado secretário municipal de educação de Vilhena em 1977, Angelim acumulou o cargo com o de administrador do então distrito de Colorado do Oeste. Em 1982 foi eleito deputado estadual e nessa condição relatou os trabalhos da comissão que elaborou a Constituição de Rondônia.
Primeiro vice-presidente do diretório estadual do PMDB e presidente da Assembleia Legislativa, renunciou ao mandato após ser nomeado governador pelo presidente José Sarney, em 1985.
Na noite de 21 de dezembro de 1988, foi sequestrado por um desconhecido, juntamente com sua família, e libertado menos de uma hora depois mediante pagamento de resgate. No pleito de outubro de 1989, candidatou-se ao Senado na legenda do Partido Trabalhista Renovador (PTR), sem êxito, perdendo para o advogado Odacir Soares Rodrigues. Retirou-se da cena política e passou a administrar uma fazenda de sua propriedade.
Morreu em Cuiabá aos 82 anos, em julho de 2017.
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* 1943 – ano da criação do Território Federal do Guaporé pelo presidente Getúlio Vargas, através do Decreto nº 5.812, com área territorial formada por parte dos estados do Amazonas e do Mato Grosso. Desde então, todos os governadores – inclusive os do Território Federal de Rondônia – foram nomeados por presidentes, conforme mostramos nessa série de matérias.
O sentido exato do mandato tampão é o período de tempo acrescido ao tempo regular de um mandato com o intuito de manter a estabilidade política.
** Referente ao bispo e santo católico italiano Daniel Comboni, que foi missionário no Sudão (África), onde morreu em 1981, vítima de febres. O Papa João Paulo canonizou-o em 5 de outubro de 2003.
Saiba mais de Comboni neste site.
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