Iniciado julgamento de ADI contra norma que autoriza utilização de amianto crisotila

De acordo com a Abrea, o preceito da livre iniciativa não pode ignorar a função social das empresas e a preservação do meio ambiente.

STF
Publicada em 10 de agosto de 2017 às 20:47

No início do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4066, no Plenário do Supremo Tribunal Federal, nesta quinta-feira (10), com o objetivo de impugnar dispositivo da Lei 9.055/1995 que disciplina a extração, industrialização, utilização e comercialização do amianto crisotila (asbesto branco) e dos produtos que o contenham, representantes da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), da Associação Nacional do Procuradores do Trabalho (ANPT), proponentes da ação, e de amici curiae (amigos da Corte), apresentaram seus argumentos na tribuna do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento foi suspenso após as sustentações orais e deve ser retomado no dia 17.

Anamatra
Em nome da entidade, o advogado Alberto Pavie defendeu a legitimidade das entidades para questionar a lei. Ele salientou o alinhamento do tema da ADI com a finalidade institucional das autoras, pois a Anamatra, em seu estatuto, prevê a valorização do trabalho humano e da dignidade da pessoa humana, e a ANPT tem como um de seus objetivos a colaboração com o poder público na defesa dos interesses sociais. “Esses objetivos institucionais estatutários é que os autorizam a impugnar uma lei que permite atividade econômica que se coloca em oposição à valorização do trabalho humano, à dignidade da pessoa, à saúde e à segurança do trabalhador”, afirmou.

ANPT
O representante da associação, Roberto Caldas, salientou que consensos médicos oriundos de diversas entidades internacionais independentes, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização Internacional do Trabalho (OIT), direcionam-se no sentido do banimento da utilização do amianto em virtude do alto grau de periculosidade à saúde dos trabalhadores e dos consumidores dos produtos que o contenham. Ele destacou o elevado custo social e humano e altíssimos gastos em tratamento de saúde e previdência em razão das enfermidades decorrentes da exposição ao amianto.

Segundo Caldas, o julgamento coloca na balança a saúde física dos cidadãos com a liberdade de empreender. Nesse sentido, informou que, com exceção de duas empresas, todas as indústrias do setor já firmaram termo de ajustamento de conduta do Ministério Público do Trabalho para interromper a fabricação de produtos com amianto. Em seu entendimento, o pedido de inconstitucionalidade se fundamenta na observância dos princípios constitucionais da defesa da dignidade da pessoa humana, da finalidade social do trabalho, do direito social à saúde e o do direito dos trabalhadores à redução dos riscos laborais no exercício de suas atividades.

Abrea
O representante da associação, Mauro de Azevedo Menezes, observou que, segundo dados do Ministério da Saúde, apresentados durante audiência pública sobre amianto realizada no STF, entre 2008 e 2011 foram constatadas 25 mil internações no sistema de saúde em razão da exposição ao amianto e que o Sistema Único de Saúde (SUS) desembolsou R$ 291 milhões com internações hospitalares, tratamentos e exames dessas pessoas.

De acordo com a Abrea, o preceito da livre iniciativa não pode ignorar a função social das empresas e a preservação do meio ambiente. Destacou que Convenção 162 da OIT estabelece que, havendo viabilidade técnica da utilização de materiais substitutivos, é recomendável que se elimine o uso do amianto, o que já ocorreu em mais de 70 países, inclusive em toda a União Europeia, que o fez a partir de 2005.

CNTI
Pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), falou o advogado Marcelo Ribeiro, que questionou a legitimidade dos autores da ação – a ANPT e a Anamatra –, afirmando que as duas entidades não representam a categoria. Ele ressaltou que, conforme cientistas renomados, não há mal algum em usar o amianto crisotila.

IBC
Em nome do Instituto Brasileiro do Crisotila (IBC), Carlos Mário Velloso Filho lembrou voto do ministro Marco Aurélio na ADI 3937, quando ressaltou que a vida contemporânea reclama a convivência com substâncias que podem trazer riscos à saúde humana, mas que, por outro lado, oferecem inúmeros benefícios à sociedade, como é o caso do níquel, carvão, cromo, cloreto de vinila (matéria prima do polipropileno, substituto do crisotila), mercúrio (que está em terceiro lugar na lista de substâncias perigosas da Agência Americana), benzendo, amianto crisotila (que está em 119º lugar na referida lista). Para ele, deve-se editar uma legislação – como a Lei Federal 9.055/1995 – onde se proíbe o uso do amianto marrom e do amianto azul, de impossível uso seguro, bem como estabelece restrições, parâmetros e cuidados em relação ao uso do amianto crisotila. “Não há razão para que o Poder Judiciário substitua o juízo de discricionariedade do Poder Legislativo que atuou a contento e em obediência ao princípio da razoabilidade”, ressaltou.

FIEB
Da tribuna do Plenário do STF, o advogado Rodrigo Alberto Correia da Silva, da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB), alertou que muitos produtos usados no cotidiano da população levam, em sua fabricação, componentes cancerígenos ou que fazem mal ao meio ambiente. De acordo com ele, diversos produtos da vida moderna estão na Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (Linach), da Portaria Interministerial nº 9/2014, como referência para formulação de políticas públicas, a exemplo do pó de sílica (utilizado na fabricação de esmaltes, vidros, óculos) e cádmio (baterias). O advogado afirmou que, atualmente, nem todo uso do amianto crisotila se dá na construção civil. “Não sabemos do futuro, uma vez que nós temos discussão do uso da canabis e de opiácios em medicamentos, então não podemos barrar a evolução tecnológica de desenvolvimento por conta do produto em si. O uso, sim, precisa ser avaliado”, destacou.

Abiclor
O advogado Tércio Sampaio Ferraz Júnior, representando o amicus curie Associação Brasileira da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados, defendeu a adoção de prazos para a adaptação à restrição ao amianto, ao invés da simples proibição. Para isso, fez menção a uma legislação que não tem a constitucionalidade questionada, que restringe o uso o amianto no processo produtivo do cloro. Segundo ele, a lei prevê um prazo para a sua substituição. “A substituição não é simples, cada empresa deve desenvolver a forma de substituir”, diz. Segundo ele, das 13 produtoras de cloro do Brasil, 12 já substituíram o amianto. “Não é algo que se possa apenas afastar”, afirmou.

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