Maus Caminhos: oficial da PM, médico e empresária são alvos de ação por corrupção ativa e passiva

Por meio da empresa Salvare, organização criminosa pagou ao coronel Aroldo Ribeiro R$ 210 mil por esquema de proteção ilegal de policiais civis e militares a membros do grupo.

MPF
Publicada em 30 de julho de 2018 às 13:25
Maus Caminhos: oficial da PM, médico e empresária são alvos de ação por corrupção ativa e passiva

Foto: iStock

O esquema de proteção ilegal, por parte de policiais civis e militares do Amazonas, a membros do grupo criminoso desbaratado pela operação Maus Caminhos, financiado com recursos públicos da saúde, é o mais novo alvo do Ministério Público Federal (MPF). O órgão denunciou à Justiça Federal o coronel da Polícia Militar do Estado Aroldo da Silva Ribeiro, o médico e empresário Mouhamad Moustafa e a empresária Priscila Marcolino Coutinho pelos crimes de corrupção ativa e passiva, cometidos em razão de pagamentos que sustentavam o braço militar da organização criminosa que desviava milhões de reais da saúde pública do estado do Amazonas.

As apurações concluíram que Mouhamad Moustafa e Priscila Marcolino pagaram, por meio da empresa Salvare Serviços Médicos  R$ 210 mil ao coronel Aroldo Ribeiro, em parcelas de R$ 10 mil mensais, por serviços de segurança privada chefiados pelo oficial e efetivados ilegalmente por ele mesmo e por outros policiais civis e militares de sua confiança. Entre as ações do braço armado da organização foram identificadas atividades de proteção pessoal de líderes do grupo, segurança e realização de saque e transporte de dinheiro, atos de coação e até prática de tortura, este último crime já denunciado pelo MPF em outra ação.

Desde o início das interceptações obtidas com autorização da Justiça, foi possível verificar que Mouhamad e Priscila contavam com segurança privada de policiais, tanto para deslocamentos próprios em Manaus e em viagens, quanto para a realização de algumas tarefas que envolviam o transporte de dinheiro. Com o avançar das investigações, outras referências sobre a segurança armada começaram a aparecer. Em uma das situações, a Polícia Federal flagrou um policial civil carregando o malote de dinheiro em espécie sacado por uma funcionária das empresas envolvidas no esquema, a quem ele acompanhava como segurança no momento.

De acordo com a denúncia do MPF, integravam a equipe chefiada por coronel Aroldo 11 policiais, sendo dois investigadores da Polícia Civil e nove soldados e oficiais da PM. Eles eram pagos diretamente pelo coronel – nominado pelo próprio Mouhamad como chefe de sua segurança pessoal também em diálogos telefônicos interceptados. A partir da quebra de sigilo bancário, os órgãos de investigação verificaram que o coronel recebeu, em uma única oportunidade, R$ 120 mil da empresa Salvare, como pagamento pelos serviços ilegais prestados ao grupo.

O documento, que acusa os réus perante a Justiça, reúne uma série de outras situações identificadas em mensagens de texto e conversas telefônicas entre os membros da organização criminosa nas quais fica demonstrado claramente o abuso das funções dos policiais, em especial pelo coronel da PM Aroldo Ribeiro, em prol do esquema e de seus integrantes, incluindo diversos episódios de quebra ilegal de sigilo funcional com o objetivo de levantar dados sigilosos de desafetos de Mouhamad. O próprio oficial da PM confessou os fatos durante o interrogatório policial.

Como pedidos finais da ação penal, o MPF requer a condenação dos réus pela prática dos crimes de corrupção passiva e corrupção ativa, previstos nos artigos 317 e 333 do Código Penal, de forma continuada e cumulativa em diversas ocasiões. As penas máximas individuais para cada situação de corrupção passiva e de corrupção ativa confirmada é de 12 anos, que poderão ser somadas ao final da sentença. O MPF pede ainda a condenação dos três acusados ao dever de reparar os danos causados aos cofres públicos, devidamente atualizados, no valor total de R$ 330 mil.

A ação penal tramita na 4ª Vara Federal do Amazonas, sob o nº 0010612-05.2018.4.01.3200.

Operação Maus Caminhos – Deflagrada em setembro de 2016, a operação Maus Caminhos desarticulou um grupo que possuía contratos firmados com o governo do estado para a gestão da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Campos Sales, em Manaus; da Maternidade Enfermeira Celina Villacrez Ruiz, em Tabatinga; e do Centro de Reabilitação em Dependência Química (CRDQ) do estado do Amazonas, em Rio Preto da Eva. A gestão dessas unidades de saúde era feita pela organização social Instituto Novos Caminhos (INC).

Dos quase R$ 900 milhões repassados, entre 2014 e 2015, pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS) ao Fundo Estadual de Saúde (FES), mais de R$ 250 milhões teriam sido destinados unicamente ao INC.

As irregularidades foram comprovadas por meio de informações bancárias e fiscais e conversas telefônicas, obtidas mediante ordem judicial, relatórios de órgãos de fiscalização como o Ministério da Transparência, Controladoria-Geral da União e Receita Federal, e ainda documentos obtidos nas buscas e apreensões, inquéritos policiais e outros documentos encontrados em fontes abertas.

Os órgãos de fiscalização apuraram que os maiores fornecedores do INC eram apenas três empresas: Salvare Serviços Médicos, Total Saúde Serviços Médicos e Enfermagem e Sociedade Integrada Médica do Amazonas (Simea), que faziam parte, na verdade, de um mesmo grupo econômico, comandado por Mouhamad Moustafa.

A investigação mostrou ainda a existência de um forte braço político do esquema, também denunciado pelo MPF, envolvendo o ex-governador do Amazonas José Melo de Oliveira e cinco ex-secretários. Os gestores públicos denunciados eram diretamente beneficiados por meio de distribuição de propina e outras vantagens provenientes dos desvios de verbas públicas coordenados pelo médico Mouhamad Moustafa. O processo em que os agentes políticos são acusados de integrar a organização criminosa está em fase de audiências de interrogatório de testemunhas de acusação e de defesa, e de oitiva dos réus.

Mouhamad Moustafa, Priscila Marcolino Coutinho, Jennifer Naiyara Yochabel Rufino Correa da Silva e Alessandro Viriato Pacheco já foram condenados por organização criminosa a penas de prisão que, somadas, ultrapassam 36 anos. Além da prisão, as penas incluem pagamento de multas milionárias e a perda de bens de alto valor apreendidos quando a operação foi deflagrada. Em relação a outros integrantes do grupo, a ação penal por organização criminosa segue tramitando na Justiça Federal.

Outras dezenas de ações criminais por peculato e contratação direta e ações de improbidade administrativa foram ajuizadas pelo MPF contra os envolvidos no esquema e contra empresas utilizadas para o desvio de recursos, ainda em tramitação na Justiça.

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