MPF quer que Funai dê prosseguimento a três processos de demarcação de terras indígenas em Rondônia

Há mais de uma década povos indígenas de Rondônia reivindicam a demarcação de seus territórios tradicionais

Ascom MPF/RO
Publicada em 14 de maio de 2020 às 19:23
MPF quer que Funai dê prosseguimento a três processos de demarcação de terras indígenas em Rondônia

O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com três ações civis públicas contra a União e a Fundação Nacional do índio (Funai) solicitando, em caráter de urgência, a retomada dos processos de demarcação dos territórios tradicionais dos povos indígenas de Rondônia Kujubim e Djeorimitxi (Jabuti), Migueleno e Puruborá.

Nas ações, o MPF solicita à Justiça Federal que determine que a Funai cumpra os prazos do Decreto 1.775, de janeiro de 1996, designando um grupo técnico especializado para realizar estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, ambiental e levantamento fundiário, necessários à delimitação de terras indígenas para a conclusão do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) em até 60 dias, e a conclusão dos processos de demarcação dos territórios tradicionais no prazo máximo de 24 meses. O MPF requer também a condenação da Funai e da União para que reparem os danos morais coletivos sofridos pelas comunidades indígenas nesses anos todos de espera por meio da constituição de um fundo de desenvolvimento comunitário para os membros de cada etnia.

O MPF argumenta na ação que no contexto de pandemia causada pela covid-19, os povos indígenas sem território demarcado têm sua situação de vulnerabilidade agravada pela precariedade no atendimento de saúde. Alem disso, o Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) tem alterado posicionamento para somente atender indígenas com território demarcado, o que já motivou a expedição de recomendação por parte do MPF anteriormente. Fora que a falta de território demarcado inviabiliza a adoção de medidas de isolamento social, como o controle de fluxo de pessoas, necessário para mitigar o contágio pelo novo coronavírus.

Etnia Puruborá - O povo Puruborá é originário de região próxima ao Rio Manoel Correia, tributário do Rio São Miguel, hoje localizado no município de Seringueiras (RO), onde seus antepassados foram encontrados pelo Marechal Cândido Rondon, em 1912. Segundo os registros verificados, os índios Puruborá foram vítimas de três expulsões: a primeira ocorreu entre as décadas de 1910 e 1940, quando oficiais e dirigentes do governo brasileiro estimularam a invasão de suas terras tradicionais por companhia de exploração de borracha e dos vários seringueiros que chegaram ao local. A segunda expulsão ocorreu em 1982, quando houve a delimitação da Reserva Biológica do Guaporé, que abrangeu área do antigo seringal de Limoeiro, onde habitavam vários Puruborá, e a terceira expulsão se deu com o processo de demarcação da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau, ocasião que a própria Funai desconsiderou a identidade indígena daquele povo, em 1994.

O processo administrativo de demarcação do território tradicional do Povo Puruborá está pendente de conclusão e foi iniciado há mais de 18 anos pela autarquia indígena, já tendo sido constituído diversos grupos técnicos, sem que haja a finalização do RCID daquele território e os atos subsequentes.

Etnia Kujubim e Djeorimitxi (Jabuti) - Atualmente, a maioria dos membros dessas etnias vive em Guajará-Mirim, na Terra Indígena Rio Guaporé, antigo aldeamento Ricardo Franco, para onde foram obrigatoriamente transferidos pelo então Serviço de Proteção ao Índio, nas décadas de 1930 e 1940. Outros indígenas Kujubim estão dispersos pelos municípios de Seringueiras, Costa Marques e arredores.

A reivindicação fundiária do povo Kujubim e Jabuti avançou somente até a apresentação de versão preliminar (parcial) do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) da Terra Indígena Rio Cautário, em 2016. A reivindicação territorial desses povos indígenas está pendente de conclusão há quase 12 anos.

Etnia Migueleno - De acordo com os registros históricos apurados pelo MPF, há cerca de 100 anos o povo Migueleno ocupava toda a região do baixo e médio Rio São Miguel, hoje localizado no município de São Francisco do Guaporé. Após serem arregimentados para trabalhar na coleta da seringa na região, o Serviço de Proteção ao Índio, pautado pela teoria da aculturação, ainda em 1928, considerou os Migueleno como grupo extinto, alegando sua integração à sociedade nacional.

Desde então, a etnia foi quase totalmente dizimada pela invasão de seus territórios e pelas doenças epidêmicas decorrentes do contato com os exploradores, ao mesmo tempo em que foram perdendo espaço territorial para os colonizadores. Em resumo, os Migueleno foram deslocados pelo governo brasileiro para um assentamento à margem direita do Rio São Miguel, hoje conhecido como Porto Murtinho, sendo classificados como grupo de colonos assentados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Parte significativa da reivindicação fundiária do território tradicional do Povo Migueleno está inserida dentro da Reserva Biológica do Guaporé. Embora a etnia tenha reivindicado as primeiras providências da Funai há mais de 15 anos, até o momento, apenas foi concluída a etapa de qualificação da pretensão, sem sequer ter sido instaurado o procedimento administrativo de identificação e delimitação no âmbito da autarquia indígena.

Nas ações, a procuradora da República Thais Araujo Ruiz Franco destaca que "os registros apontam que todos esses povos indígenas mantinham a ocupação imemorial de seus territórios tradicionais, as quais foram interrompidas de forma involuntária, sendo que os indígenas vivenciaram violências diversas, no momento da expropriação e posteriormente passaram a transitar na região como foragidos, escondendo a identidade e a língua como uma forma de proteção".

Os números das ações civis públicas são:

Puruborá: 1002281-59.2020.4.01.4101

Migueleno: 1002280-74.2020.4.01.4101

Kujubim e Djeorimitxi (Jabuti): 1002289-36.2020.4.01.4101

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