Nota de repúdio
Vimos a público repudiar a violência obstétrica sofrida pela parturiente Luciene Gomes, de 35 anos ocorrida no último dia 28 de julho, após ter dado entrada no Hospital de Base Ary Pinheiro
Vimos a público repudiar a violência obstétrica sofrida pela parturiente Luciene Gomes, de 35 anos ocorrida no último dia 28 de julho, após ter dado entrada no Hospital de Base Ary Pinheiro. A vítima que estava acompanhada de duas vizinhas e sentindo intensas dores e contrações, foi recomendada a voltar para casa.
De acordo com as vizinhas, elas avisaram que a gestante não poderia ter um parto normal, pois a mesma tinha complicações desde o seu primeiro parto e necessitava ser submetida a um parto Cesário.
Luciene, após três dias de trabalho de parto não resistiu e acabou falecendo, a suposta irresponsabilidade e negligência deixaram os familiares e amigos tristes e revoltados, na possível certeza que a mulher morreu por negligência médica. Foi registrado um boletim de ocorrência e agora o caso está sendo investigado pela justiça.
Uma inusitada decisão do Ministério da Saúde aboliu o uso do termo “violência obstétrica”. Em despacho feito pelo Governo Federal, se justifica que o termo “tem conotação inadequada, não agrega valor e prejudica a busca do cuidado humanizado”. Como se o problema estivesse nas palavras e não na realidade.
A violência obstétrica é uma das violências mais comuns praticadas contra a mulher e em geral uma violência de gênero invisibilizada e naturalizada.
A naturalização da dor relacionada ao processo de parto se impõe à mulher como um castigo. A Escritura Sagrada menciona as dores do parto como punição, devendo a mulher senti-la por ter cometido o pecado original, sugerindo a dor como parte indissociável da maternidade – uma espécie de punição. A violência obstétrica é a naturalização da dor, é o olhar para os nossos corpos como se fossem máquinas de parir, dar prazer e sentir dor, uma máquina que não pode reclamar, chorar, gritar e nem opinar: apenas deve parir.
No Brasil, uma em cada quatro mulheres sofre algum tipo de violência durante o atendimento no parto, tais como: gritos, procedimentos dolorosos não autorizados ou não informados, ausência de anestesia, abuso de medicamento ou negligências (há registros inclusive de abuso sexual por parte de médicos durante o pré-natal). A violência obstétrica ocorre na maioria das vezes durante o parto e no pós-parto, momentos em que a mulher está mais vulnerável e com as condições de reação reduzidas. As mulheres negras e indígenas estão entre as mais vulneráveis, tendo as mulheres indígenas quase seis vezes mais chances de morrer no parto do que mulheres brancas.
Segundo dados lançados em 2014 na campanha “SUS sem racismo”, do Ministério da Saúde, 60% das vítimas de mortalidade materna no país são negras – importante ressaltar que a morte materna é considerada prevenível e em 90% dos casos, a morte poderia ser evitada com atendimento adequado; somente 27% das mulheres negras tiveram acompanhamento durante o parto, enquanto do lado das mulheres brancas esse número chega aos 46,2%.
Entre as mulheres negras, as principais causas de morte materna são: hipertensão, hemorragia e infecção puerperal, registrados na hora do parto ou posteriormente ao nascimento do bebê.
Humanizar a gestação, o parto e o pós-parto, implica em ter um sistema de saúde público adequado para que as mulheres sintam-se seguras, acolhidas e respeitadas, com seus medos, inseguranças e suas dores, dores que nem sempre são relacionadas ao concreto do parto – da ação médica – e sim ao concreto da vida, do cotidiano que se transforma ao ser mãe.
Neste contexto, continuaremos organizadas e em luta para combater a violência obstétrica que significa defender o atendimento médico como um momento mais acolhedor e digno. Significa defender o respeito aos nossos direitos e às nossas escolhas. Significa humanizar o atendimento e o olhar sobre os nossos corpos.
Porto Velho, 06 de agosto de 2019.
Rosenegra Ferreira – Secretária Estadual de Gênero e Etnia do SINTERO.
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