OAB: fim dos exames é vitória do estelionato educacional

O objetivo, claro, é fragilizar o poderio institucional da OAB. A conseqüência será a desestabilização do próprio estado democrático de direito.

Andrey Cavalcante
Publicada em 22 de abril de 2019 às 12:43
OAB: fim dos exames é vitória do estelionato educacional

A quem, afinal, poderia interessar o fim dos exames da OAB, a ponto de desenterrar uma proposta defendida por ninguém menos que um dos maiores expoentes da chamada "velha política", o ex-presidente da Câmara - e atual presidiário - Eduardo Cunha? Aos acadêmicos que pretendem exercer a advocacia certamente que não, posto que o exame os credencia a figurar entre os profissionais de competência chancelada pela Ordem, o que não é pouca coisa. Ao Judiciário também não, posto que o exercício do contraditório exige preparo dos litigantes. Por diversas vezes afirmei, em discurso de saudação os novos advogados em solenidades de entrega de credenciais da OAB, que "- O caminho do sucesso os senhores já conhecem: é o mesmo que trilharam para chegar até aqui. Basta seguir por ele". Isso exclui os maus estudantes, pois os bons advogados estudam e se aprimoram na profissão por toda a vida.

Na verdade, o que habilita o bacharel a advogar é o Exame de Ordem. Não há filtro melhor para aferir a capacidade mínima de um bacharel. O advogado recebe do cliente uma procuração que lhe dá poderes para lidar com o que há de mais precioso em sua vida: o patrimônio, a liberdade e a própria vida. A OAB nacional já pediu reiteradamente ao Ministério da Educação maior rigor na fiscalização da qualidade do ensino de Direito no Brasil. O lobby das faculdades que praticam o chamado estelionato educacional, porém,  sempre se saiu melhor nesse cabo de guerra e continua a oferecer formação ilusória a milhares de estudantes que, somente com, muita preparação adicional poderão obter aprovação nos exames da OAB, muitos deles após várias tentativas frustradas. Os exames são rigorosos - claro - mas definitivamente não proibitivos, posto que não são poucos os candidatos que conseguem obter aprovação mesmo enquanto ainda acadêmicos. 

E não poderia ser diferente: é fundamental, para a OAB, colocar no mercado profissionais plenamente capacitados ao exercício da atividade advocatícia. Menos que isso significa total desprezo aos anseios e aspirações - e mesmo à liberdade - do cidadão que contrata um advogado em busca de justiça. Se os oportunistas de agora, que se apropriam de velhas bandeiras já descartadas pela prevalência da razão, conseguirem sucesso em sua campanha contra os advogados brasileiros, estará então decretada a falência da defesa e o fim do equilíbrio  de forças no Judiciário - sustentáculo do sistema judicial e da própria democracia. O ensino jurídico não qualificado compromete não apenas a formação dos operadores do Direito, mas fere de morte a garantia de que cidadãos serão bem assistidos.

Ao decidir, unânime, pela constitucionalidade do Estatuto da Advocacia -  Lei 8.906, de 1994 - os ministros do Supremo afirmaram que a advocacia pode trazer prejuízos graves a terceiros. Eis porque o legislador autorizou expressamente a instituição do Exame da OAB.  E deve ser tratado como política de Estado, que não serve de moeda de troca de interesses políticos menores. Impõe-se a lembrança das palavras do então relator do processo, ministro Marco Aurélio: “Justiça é bem de primeira necessidade. Enquanto o bom advogado contribui para realização da Justiça, o mau advogado traz embaraços para toda a sociedade”.

"Quando o primeiro elo da corrente é forjado, o primeiro discurso censurado, o primeiro pensamento proibido, a primeira liberdade negada, ele nos acorrenta a todos, irrevogavelmente."  O texto integra um dos arroubos filosóficos de um personagem de ficção, mas a advertência é decididamente verossímil. Cada manifestação de espíritos desajustados, empenhados em moldar a realidade ao sabor de suas necessidades imediatas, sem qualquer compromisso com os resultados freqüentemente catastróficos de sua atitude, deve ser incisiva e rigorosamente combatida. 

A sucessão de ataques à OAB exige isso. Cada violação das prerrogativas dos advogados, cada tentativa de imposição e controle estatal, como a do TCU, cada manifestação truculenta de criminalização da defesa, cada ação aparentemente despropositada, como o ataque aos exames da Ordem, forja mais um elo dessa corrente. O objetivo, claro, é fragilizar o poderio institucional da OAB. A conseqüência será a desestabilização do próprio estado democrático de direito. É sempre bom lembrar que o gatilho daquele estudante sérvio não apenas matou o arquiduque Francisco Ferdinando em Sarajevo, como deu origem à primeira grande guerra, que resultou na segunda.

Estarei participando, entre 22 e 24 deste mês, do VII Fórum Jurídico de Lisboa, que certamente haverá de contar com a participação dos mais representativos expoentes do mundo jurídico de Portugal e do Brasil. Pretendo provocar o debate sobre a questão.
 

Comentários

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    Raimundo Ferreira de Souza 23/04/2019

    sou a favor do fim do exame de ordem, pela seguinte razão: quando uma pessoa procura um casuístico, ele sabe seus direitos e deveres, tem o estatuto da OAB e corregedoria, que apuram as infrações dos negligentes, que tem como punição, advertência, punição e cassação, saliento também que os médicos, engenheiros , não fazem exame, tão importante o médico que não pode errar, pois trata- se mexer com vidas. há um jargão popular que fala ," o mal se destrói por si mesmo ", os mal advogados serão excluídos pelos seus péssimos trabalhos.

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    Raimundo Ferreira de Souza 23/04/2019

    sou a favor do fim do exame de ordem, pela seguinte razão: quando uma pessoa procura um casuístico, ele sabe seus direitos e deveres, tem o estatuto da OAB e corregedoria, que apuram as infrações dos negligentes, que tem como punição, advertência, punição e cassação, saliento também que os médicos, engenheiros , não fazem exame, tão importante o médico que não pode errar, pois trata- se mexer com vidas. há um jargão popular que fala , o mal se destrói por si mesmo, os mal advogados serão excluídos pelos seus péssimos trabalhos.

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    Maria 23/04/2019

    Esse exame da OAB uma afronta aos estudantes que ficam 5 anos (cinco longos anos), em uma faculdade e não tem o direito de exercerem sua profissão. Parabenizo e torço para que haja reconhecimento por parte das autoridades, principalmente o Presidente da República que já manifestou ser favorável ao fim dessa fabrica de fazer dinheiro que se chama OAB. Deveriam se contentar com a arrecadação das mensalidades dos Advogados acho que já é muito dinheiro para que???.

  • 4
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    Girlei Marinho 22/04/2019

    O Grito de Liberdade e Igualdade dos Bacharéis em Direito está similar ao Grito dos revolucionários franceses e dos revolucionários ingleses (Revolução Gloriosa). Parabéns a ANB por mostrar que tem que lutar pelo direito, mas no dia que o direito estiver em conflito com a justiça lutem pela JUSTIÇA. A ambição por querer ganhar mais dinheiro deixou despercebido aqueles que se dizem conhecedor das ciências jurídicas enxergar que direito é vida e se não for humanizado perde a relevância e isso o exame de ordem não ensina por ter se tornado uma máquina de fazer dinheiro onde a racionalidade instrumental estava em nível elevado promovendo a perda da essência humana que é viver como co-humano. A nossa democracia corrobora com uma intervenção média e o exame de ordem estava intervindo de modo contundente e contrária as garantias constitucionais do direito de liberdade e Igualdade e qualquer ameaça a garantias é prejudicial a democracia por ser um retrocesso. Pois, as garantias constitucionais não cairam do céu, não foram dadas e sim conquistas.

  • 5
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    BD 22/04/2019

    Esse exame tem um valor alto e se multiplicado vezes 500 mil dar um elevado valor e se multiplicado por 3 vezes ao ano ai o valor arrecadado fica mais elevado ainda. Esse exame só faz bem a OAB em razão da elevada arrecadação. APARTHEID do mundo jurídico.

  • 6
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    Sergio 22/04/2019

    Será que os advogados com OAB antiga conseguiriam passar no exame da OAB??? Fica a pergunta pois muitos advogados que defendem o exame nem prova fizeram.

  • 7
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    Raquel 22/04/2019

    Discordo totalmente. Além da OAB ganhar fortunas com o valor das inscrições, que é mais que o dobro do valor da inscrição para um concurso público, tem muito magistrado inclusive que nem sabe escrever. Acredito que não é uma prova que vai dizer quem vai ser o melhor ou o pior profissional. Aliás, os alunos que mais faltavam as aulas quando eu cursava o curso, foram os primeiros a passar no exame.

  • 8
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    GVM 22/04/2019

    O Médico ao se formar já tem a liberdade para exercer a medicina, como as demais graduações e com os Bacharéis em direito o direito de liberdade para exercer a profissão em igualdade com as demais graduações é privado. Sem falar do valor alto da taxa de inscrição do exame de ordem. O MEC que é competente para avaliar o ensino e agora o Ministério da Economia para a Regulamentação Profissional. Liberdade e Igualdade são garantias conquistada lá na Revolução Francesa.

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