Professor, você ainda está aí?
Eu menino, tímido, filho de um sargento e de uma dona de casa, morando no limite da periferia, a maior favela da cidade era a minha varanda, uma avenida de ônibus e caminhões, o meu quintal.
Eu menino, tímido, filho de um sargento e de uma dona de casa, morando no limite da periferia, a maior favela da cidade era a minha varanda, uma avenida de ônibus e caminhões, o meu quintal. A escola era o meu remanso, meu espaço de construção da utopia que povoava meus sonhos já tão intensos. Mas eu não tinha palavras para dar ao que habitava meus pensamentos. Carecia de conceitos, fundamentos. Tudo era só mangas e cajus, areia e céu sem nuvens, formigas e lagartas, sujeira e muros, asfalto, cheiro de fumaça azulada. Insônias e temores.
A escola era o oásis do deserto do cotidiano de dores. Da porta para dentro, havia adultos que olhavam para mim, perguntavam o que eu sabia e se eu tinha alguma pergunta. Havia livros com imagens do universo e dos micróbios, dos macacos de olhos claros e das doenças que arrepiavam os pelos dos meus braços. Havia a estória de baleia, a cachorra que sonhava com preás e que me fez desejar pela primeira vez, ser escritor. Havia desenhos, ângulos, fórmulas, havia colegas com olhos de fascínio e desconhecimento, medo e avidez por um campo que se abria e florava (cactos) e ficava cada vez mais árduo e quente, intenso e áspero.
E havia aqueles adultos que não me negavam o tempo, o espaço, a moldura de quadros de outras épocas, visões do paraíso e do purgatório, “deus ao mar, o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu.” E eu bebia e não me fartava.
O que seria de quem eu sou se não fossem aqueles adultos cujos nomes me escapam mas cuja tessitura de minha alma tem fios de seus corpos entrelaçados?
O que seria de quem eu sempre quis ser sem horizontes alargados por seus repertórios e consciências?
O que seria de quem ainda sonho em ser sem o compromisso que acertei silenciosamente com eles de não deixar romper o elo da corrente?
Professores! Desde a primeira, a quem ainda chamava “tia”, tia Adla, que um dia, nos meus parcos 7 anos, disse-me as primeiras palavras de incentivo. E o professor Albuquerque, sisudo, seco como o Fabiano que me apresentou, seiva em minha vida seca de guri sem graça. E o professor Teixeira que nos impunha provas orais, pânico antes da convocação, glória depois das respostas dadas à custa de noites mal dormidas. O professor Alcides, observador arguto de minhas letras ainda tortas mas aparentemente promissoras. E outras e outros. Minha vida é um mosaico de suas palavras e entregas.
E aí, 15 de outubro, dizem-me: “feliz dia do professor”. E eu apenas sorrio, ainda tímido, meus pais ainda vivos e orgulhosos do filho “famoso”, que aparece na TV e escreve pros jornais.
Mas meu sorriso é para eles. Mestres da minha vida. Estradas. Meu caminhar não seria mais do que quebrar galhos e tropeçar em minhas próprias pernas sem seus olhares carinhosos, atentos, severos, honestos, profundos, responsáveis.
E há quem pense ser possível esse país ser algo sem que eles estejam à frente.
Ah, quimera. Ah. Que lástima.
* Daniel Medeiros é Doutor em História pela UFPR e professor no Curso Positivo.
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