Senado aprova criação de delegacias de atendimento à mulher
Entre as emendas acatadas pelo relator, Fabiano Contarato, estão a abrigação do atendimento de crimes contra a dignidade sexual e a priorização de atendimento à mulher em municípios onde não houver Deam
Com 71 votos a favor e nenhum contrário, o Senado aprovou nesta quinta-feira (11) projeto que trata da criação e do funcionamento ininterrupto de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam). O PL 781/2020, do senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL), recebeu parecer favorável do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), com emendas. O projeto segue para análise da Câmara dos Deputados.
Rodrigo Cunha ressaltou que muitas mulheres deixam de registrar ocorrência contra violências sofridas porque não há delegacias especializadas no município onde moram ou porque a delegacia da mulher não funciona à noite ou nos fins de semana. Ele citou a Pesquisa de Informações Básicas Municipais e Estaduais (Munic), divulgada em 2019 pelo IBGE, segundo a qual em 91,7% dos municípios brasileiros faltam delegacia especializada de atendimento à mulher.
O texto original previa que a União repassaria recursos do fundo para os estados que, em cinco anos contados da data de publicação da lei, criariam pelo menos uma delegacia desse tipo no município mais populoso de cada uma das suas microrregiões. O relator argumentou, no entanto, que não há informação acerca do número de municípios que poderiam ser beneficiados e que, de acordo com a Constituição, cabe ao Poder Executivo propor legislação sobre o tema.
Como alternativa, ele propôs uma emenda para determinar à União o repasse de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) para que estados possam criar Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher em conformidade com as normas técnicas de padronização a serem estabelecidas pelo Poder Executivo.
Funcionamento ininterrupto
O projeto determina que as delegacias de atendimento à mulher funcionem 24h por dia, 7 dias por semana, incluindo feriados. Esse atendimento deverá ser feito em sala reservada e por policiais do sexo feminino, preferencialmente.
Contarato propôs uma emenda para deixar claro que o funcionamento ininterrupto deve ser obedecido não só pelas delegacias que serão criadas, mas também por aquelas que já existem. “Trata-se de alteração relevante, uma vez que apenas 15% das delegacias especializadas existentes funcionam 24 horas por dia”, explica.
O texto prevê que essas delegacias prestem também assistência psicológica e jurídica à mulher vítima de violência. O relator acatou emenda do senador Paulo Paim (PT-RS) para estabelecer que esses tipos de assistência serão dados em convênio com a Defensoria Pública, os órgãos do Sistema Único de Assistência Social e os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher ou varas criminais competentes. Outra emenda aceita pelo relator, oferecida pelo senador Wellington Fagundes (PL-MT), determina que os policiais encarregados do atendimento à mulher deverão receber treinamento adequado para permitir o acolhimento das vítimas de maneira eficaz e humanitária.
Fabiano Contarato também acatou uma emenda da senadora Rose de Freitas (MDB-ES) que obriga as delegacias a disponibilizar número de telefone ou outro meio de mensagem eletrônica destinado ao acionamento imediato da polícia em casos de violência contra a mulher. Da senadora Kátia Abreu (PP-TO), o relator aceitou parcialmente uma emenda, para incluir no texto que as delegacias especializadas atendam também crimes contra a dignidade sexual. Outra emenda acatada parcialmente por Contarato, da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), determina que, nos municípios onde não houver Deam, a delegacia existente deverá priorizar o atendimento da mulher vítima de violência por agente feminina especializada.
Políticas públicas
Para Contarato, os dados disponíveis sobre violência contra a mulher no Brasil indicam a necessidade de serem desenvolvidas políticas públicas complexas, com olhar interseccional para os diferentes processos de vulnerabilidade que se sobrepõem, como a raça e a classe social, e com objetivo de eliminar a perspectiva moralizante em torno das vítimas.
Ele citou o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2020, segundo o qual há um estupro no país a cada oito minutos. “É importante deixar registrado que esse número é muito maior, pois esse crime é subnotificado em razão de diversas circunstâncias, como culpa e vergonha da vítima, medo do agressor e até mesmo desestímulo por parte das autoridades”, ressaltou.
Segundo o anuário, a maioria dos casos de estupro ocorreu contra menores de 14 anos ou pessoas que não podiam oferecer resistência ao ato (70,5%), o que configura estupro de vulnerável, e contra pessoas do sexo feminino (85,7%). Em 81,1% dos casos de estupro e estupro de vulnerável, o agressor era conhecido da vítima.
Nesse contexto, afirma o relator, as delegacias especializadas são essenciais, “pois são estruturadas para não reproduzirem o machismo na sociedade, evitando a revitimização da mulher, e possuem um ambiente acolhedor desde o primeiro atendimento da vítima”.
“Há que se considerar que a maior parte dessas mulheres tem histórico de sofrimento e o acolhimento por equipe especializada é de fundamental importância para que haja continuidade do atendimento. Essa adequação, aliás, pode estimular que se façam notificações, cuja falta, como vimos, é um dos problemas relacionados aos crimes que envolvem a dignidade sexual”, disse.
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