A velha direita foge do ato no 8 de janeiro por medo de contrariar o fascismo

Governadores que poderiam ir ao evento em Brasília preferem apostar na fidelização do espólio de Bolsonaro, escreve Moisés Mendes

Moisés Mendes
Publicada em 05 de janeiro de 2024 às 16:43
A velha direita foge do ato no 8 de janeiro por medo de contrariar o fascismo

(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

É previsível a escolha feita por governadores que não participarão do ato do primeiro ano do 8 de janeiro em Brasília. Eles poderiam ficar ao lado dos líderes dos poderes invadidos pelos golpistas. Ficaram ao lado dos golpistas. Nenhuma surpresa.

Não há nenhuma arapuca de Lula ao programar o evento pensando em expor os bolsonaristas ausentes, os convictos e os vacilantes. Até porque Lula ainda tenta conquistar a parte menos extremista das bases dessa gente.

Mas governadores de direita enxergam o evento como um risco diante do eleitorado que têm ou pretendem conquistar. Mesmo que o lastro eleitoral de um Eduardo Leite, por exemplo, não tenha origem no fascismo. 

Entre ficar ao lado de Alexandre de Moraes, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira – e se possível distante de Lula – e manter os laços que o conectam com parcela do bolsonarismo, Leite prefere a segunda alternativa.

O ato que vai relembrar a invasão de Brasília, para que nunca seja esquecida, expõe obviedades, como a de que não interessa a Tarcísio de Freitas, Jorginho Mello e Ronaldo Caiado participar do encontro no Congresso. Por fidelidade e dívidas políticas com Bolsonaro e com os que ele ainda mobiliza.

Mas Romeu Zema e Leite se juntam aos colegas bolsonaristas, quando poderiam fazer foto com o ministro do Supremo que teria sido enforcado, se o golpe tivesse dado certo.

Alexandre de Moraes revela agora detalhes das ameaças de morte, incluindo a forca, enquanto vê a antiga direita afastar-se ainda mais dele e aproximar-se do golpismo que segurava a corda. 

Uma conclusão apressada pode indicar que eles evitam constrangimentos com os invasores dos prédios, muitos já condenados. Mas não é deles que os governadores se ocupam.

Os governadores ausentes do ato de 8 de janeiro querem estar presentes na memória dos acampados. São os acampados, que fizeram vigília ao lado de quartéis, e os tios do zap a base que não deve ser incomodada. 

Os manés invasores não importam mais e já foram abandonados. Mas os acampados, todos impunes, com exceção dos que estavam no entorno do QG do Exército em Brasília e foram presos no 9 de janeiro, esses escaparam da polícia, do Ministério Público e da Justiça. 

Na entrevista dessa semana ao Globo, Moraes enfatizou que os acampados cometeram crimes, mas conseguiram se livrar de prisões, indiciamentos e julgamentos. 

É essa turba, seus admiradores e simpatizantes e tudo o que representam que interessam aos governadores, assim como seus financiadores também impunes.

Os acampados afrontaram a legitimidade da eleição de Lula, mas desafiaram mesmo o poder do Supremo. Eles queriam pegar Alexandre de Moraes, certos de que assim dobrariam a coluna do Judiciário.

Os governadores fazem média com os acampados e tudo o que representam, porque precisam fidelizar o espólio de Bolsonaro. Temem a rejeição e as reações dos extremistas.

Bolsonaristas de ocasião que pensam em 2026, e Eduardo Leite e Zema são os melhores exemplos, mandam sinais a essa base de extrema direita para depois expandir seus alcances na velha direita. Como Bolsonaro fez em 2018 e tentou repetir em 2022.

Um aceno público e respeitoso à democracia e às instituições é menos importante para os governadores de direita do que a preservação dos seus vínculos com o bolsonarismo.

Uma presença ao lado de Alexandre de Moraes hoje é pouco relevante, porque seus projetos como herdeiros das sobras de Bolsonaro não podem ser ameaçados.

Nesse cenário, é quase inútil dedicar-se ao consolo de que a História se encarregará do julgamento dos ausentes no ato do dia 8. A História está cansada e não tem mais esse poder de oferecer reparações.

Eles não irão ao evento, mandarão dizer que têm agenda programada há um ano ou que estão fazendo check-up ou viajaram à Capadócia, e nada acontecerá. 

A História anda tão esquecida que nem se lembrará de que os ausentes no ato do dia 8 em Brasília se esforçam para fidelizar o voto de gente que poderia comemorar o enforcamento de Alexandre Moraes.

Moisés Mendes

Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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