Crime organizado é responsável pelo desmatamento da Floresta Amazônica, afirma Raquel Dodge
Para combater o problema, PGR destaca a importância da implementação de mecanismos de cooperação internacional
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou, nesta segunda-feira (2), que o crime organizado é responsável pelo desmatamento da Floresta Amazônica e que, segundo informações apuradas pelo Ministério Público Federal (MPF), há indícios da existência de associação entre os grupos que derrubam a mata e os compradores de madeira no exterior, para onde segue grande parte do produto extraído ilegalmente no território nacional. Segundo a PGR, para reverter o problema, é preciso valorizar o papel do Ministério Público dentro do sistema penal acusatório e investir em mecanismos de cooperação internacional que levem em conta as características de cada tipo de delito, com ações tanto no plano doméstico quanto no internacional. As declarações foram feitas na solenidade de abertura da reunião de trabalho entre procuradores do Ministério Público Federal (MPF) representantes da Eurojust (Unidade de Cooperação Jurídica da União Europeia). O evento ocorre nesta segunda e terça-feira (2 e 3), na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília.
Ao avaliar o tema do desmatamento no Brasil, Dodge fez questão de salientar que é preciso enfrentar a questão como fenômeno transnacional. “As informações que temos é de uma associação estreita entre quem desmata e quem compra madeira. Entre quem desmata, e põe fogo na mata, e quem usa essa madeira no exterior. [A madeira] não é usada só no território brasileiro. Aliás, é poucas vezes usada no território nacional. Inclusive, porque o porto do escoamento é no Norte do Brasil, não é para dentro do Brasil”, afirmou a procuradora-geral. Segundo ela, o empreendimento de desmatamento é muito oneroso. “Porque adentrar a floresta, desmatá-la numa primeira fase com uso de mão de obra escrava, carregar aquelas toras, encaminhá-las pelo rio até chegar ao porto, transportá-las de navio até o exterior é obra de uma organização e de um engendramento que não é fruto de coautoria, de uma ação ocasional não planejada”, acrescentou.
Dodge reforçou a necessidade da implementação de ações de cooperação entre o Ministério Público brasileiro e autoridades estrangeiras, ressaltando que é preciso enfrentar o problema do combate à corrupção e à lavagem de dinheiro com instrumentos que vedem transferência dissimulada para o exterior, de valores do patrimônio público brasileiro. “Inclusive, porque os outros países têm sido santuário do desvio do dinheiro do patrimônio público brasileiro. Se não houver cooperação para que os países europeus não sejam o destino desse dinheiro desviado do nosso patrimônio público, essa corrupção continuará a ser praticada”, asseverou.
Os altos índices de violência também foram abordados por Raquel Dodge. Para ela, o crime organizado é responsável por grande parte dos 65 mil homicídios que ocorrem por ano no Brasil. Muitas dessas mortes são relacionadas ao tráfico internacional e ao tráfico doméstico de drogas. “O Brasil não é produtor da maioria da droga associada ao tráfico internacional”, observou.
Papel do Ministério Público – Dodge fez defesa veemente do papel do Ministério Público dentro do sistema penal acusatório, que é o adotado no Brasil, e no qual há distinção entre o órgão acusador, a defesa e o juiz imparcial. Ela criticou o que chamou de amarras impostas aos Ministérios Públicos em diversas partes do mundo, disse ser importante o intercâmbio de informações, previsto em leis e necessário para o ajuizamento de denúncias, pedidos de busca e apreensão, e autorizações de interceptações telefônicas que aprofundem a investigação. “É avanço importantíssimo termos um órgão que acusa, outro que defende, e o juiz que julga. E por que o protagonismo do juiz no enfrentamento do crime organizado, sendo que o papel dele é de neutralidade? Ele vai receber a prova das duas partes. É preciso enfatizar a cooperação dentro do sistema de Justiça, mas dando a cada ator, considerando o sistema penal acusatório, o papel de preponderância que tem. E nesse ambiente, o Ministério Público precisa ter o papel destacado que a Constituição e as leis do Brasil lhes confere”, finalizou.
Participaram da solenidade de abertura a secretária Nacional de Justiça, Maria Hilda Marjiaj Pinto; a conselheira da delegação da União Europeia no Brasil, Domenica Bruma; o representante da Eruojust Antonio Cluny e a representante do El PacCto (Europa-América Latina Programa de Assistência contra o Crime Transnacional Organizado) Glória Alves. Também estiveram presentes a secretária de Cooperação Internacional da PGR, Cristina Romanó, e os secretários adjuntos Carlos Bruno Ferreira e Denise Neves Abade.
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