STJ dá salvo-conduto para três pacientes cultivarem cannabis para fins medicinais
Decisão da Sexta Turma seguiu entendimento defendido pelo Ministério Público Federal em sustentação oral
Em decisão unâmine, em sessão realizada nesta terça-feira (14), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguindo entendimento do Ministério Público Federal (MPF), autorizou o cultivo da Cannabis sativa (maconha) a três pessoas, com a finalidade de extrair óleo medicinal para uso próprio no tratamento de doenças graves, sem o risco de sofrerem qualquer repressão por parte da polícia e do Judiciário.
Em sustentação oral, o subprocurador-geral da República José Elaeres Marques defendeu a concessão de habeas corpus nos casos em julgamento, pois a conduta de cultivar cannabis para extrair o extrato de cannabis sativa promediol para tratamento médico de pessoas acometidas de enfermidades graves consiste em conduta penalmente atípica, em razão da atração da excludente de ilicitude denominada estado de necessidade. "É de se ressaltar que o pleito inicial nessas ações não é de autorização para o cultivo enquanto pedido imediato, mas tão somente que a conduta de cultivar para fins estritamente medicinais não seja reprimida criminalmente com ameaça de prisão em flagrante", afirmou.
O representante do MPF informou que, desde 2015, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu aproximadamente 26 mil autorizações de importação do extrato in natura da cannabis para fins medicinais, mediante recomendação médica. Todavia, essa possibilidade não tem sido suficiente para proporcionar amplo acesso ao medicamento, especialmente em razão dos elevados preços do produto. "Não se pode exigir das pessoas que necessitam do canabidiol que arquem com os elevados custos de aquisição do medicamento, pois muitas delas não têm as mínimas condições financeiras para tal. Também não se pode exigir das pessoas que têm condições de importar, que aguardem por longos períodos em razão do procedimento burocrático de importação, o que, em muitos casos, pode causar descontinuidade do tratamento", destacou.
Marques explicou que, nesse cenário de grande demanda, os pais de pacientes com epilepsia, doença que não se mostra controlável por medicamentos tradicionais, se associaram a outras pessoas com as mais diversas enfermidades tratáveis com a planta visando ao plantio, à produção e distribuição do óleo de cannabis no país. Estudos demonstram que a cannabis pode ajudar a combater muitas doenças graves, entre as quais, epilepsia, parkison, autismo, fribromialgia, doença de Crohn, dores crônicas, glaucoma e câncer.
Em razão disso, em abril de 2017, a Segunda Vara da Justiça Federal na Paraíba, em decisão inédita no país, e em conformidade com a manifestação do MPF, autorizou a Associação Brasileira de Apoio – Cannabis Esperança Abrace a cultivar e manipular a planta exclusivamente para fins medicinais. Desde então, a entidade passou a atender mais de 14 mil famílias com as mais diversas enfermidades. "Não obstante a possibilidade de se importar e de se conseguir o produto via associações, o preço ainda se revela fator determinante e impeditivo para a continuidade dos tratamentos em vários casos", ressaltou José Elaeres.
Diversas famílias, portanto, na busca de uma alternativa viável têm trilhado o caminho do Judiciário postulando por meio de habeas corpus, salvo-conduto para cultivar e extrair em casa o extrato medicinal de cannabis sem o risco de serem presas. Há também busca por cursos de cultivo e oficinas de extração, promovidos pelas associações.
O subprocurador-geral salientou que as autoridades públicas admitem a eficácia e reconhecem a possibilidade de importação do medicamento, porém o custo dessa importação e também dos insumos e derivados é elevado e depende das seguintes providências e etapas: prescrição da receita por um profissional legalmente habilitado; cadastramento do paciente perante a Anvisa, análise do pedido e a emissão da autorização para importação pela agência reguladora.
Na avaliação de José Elaeres, o cultivo da cannabis visa ao resguardo de perigo atual em relação à saúde da pessoa acometida de determinada doença. “O perigo atual ameaça direito próprio ou de terceiro familiar incapaz acometido de doença. A pessoa interessada no plantio para fins de tratamento da própria saúde não deu causa à situação de risco à sua vida. O plantio de cannabis mostra-se como único meio para salvaguardar o direito à saúde e à uma vida com maior dignidade amenizando os efeitos da doença”, ressaltou o subprocurador-geral da República, que opinou pela concessão dos habeas corpus.
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