TJRO decide que comunicação de suposto fato criminoso às autoridades não gera dano moral

A decisão foi unânime e o recurso dos apelantes foi negado nos termos do voto do relator

Rondônia Jurídico
Publicada em 12 de maio de 2023 às 15:37
TJRO decide que comunicação de suposto fato criminoso às autoridades não gera dano moral

O Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia proferiu um acórdão no dia 02/05/2023, nos autos de número 0011704-89.2012.8.22.0005, que trata de uma apelação cível de indenização por responsabilidade civil. A ação alegava que a instauração de inquérito civil teria gerado danos morais aos autores.

O relator do caso, Desembargador Rowilson Teixeira, decidiu que a comunicação ( no  caso, por advogados de Ji-paraná, Rondônia) de um fato supostamente considerado criminoso às autoridades públicas, que resulte na abertura de inquérito civil, é um exercício regular de direito e, portanto, não gera dano moral. Para que haja a configuração do dever de indenizar, é necessário que o réu tenha agido dolosa ou culposamente, de forma maliciosa ou, pelo menos, sem observância do dever objetivo de cuidado.

A decisão foi unânime e o recurso dos apelantes foi negado nos termos do voto do relator. 

ÍNTEGRA DA DECISÃO

Processo: 0011704-89.2012.8.22.0005 - APELAÇÃO CÍVEL (198)

Relator:  ROWILSON TEIXEIRA

Data distribuição: 04/11/2022 10:46:09

Data julgamento: 04/05/2023

Polo Ativo: AHMED LATIF MESTOU e outros

Advogados do(a) APELANTE: BASSEM DE MOURA MESTOU - RO3680-A, JOSE ALBERTO DOS SANTOS - SP152216-A
Advogados do(a) APELANTE: BASSEM DE MOURA MESTOU - RO3680-A, JOSE ALBERTO DOS SANTOS - SP152216-A

Polo Passivo: Lia Felberg. e outros (2)

Advogados do(a) APELADO: MARCELO HARTMANN - SP157698-A, MARIO CELSO SILVA JUNIOR - SP363270-A
Advogado do(a) APELADO: GERALDO SANTAMARIA NETO - SP324143-A
Advogados do(a) APELADO: MARCELO HARTMANN - SP157698-A, MARIO CELSO SILVA JUNIOR - SP363270-A

 

RELATÓRIO

 

Ahmed Latif Mestou e Bassem de Moura Mestou recorrem da sentença proferida pelo juiz da 1ª Vara Cível da comarca de Ji-Paraná que julgou improcedentes os pedidos formulados nos autos de ação de indenização por danos morais proposta contra Lia Felberg, Rodrigo Felberg e João Marcos Gomes Cruz Silva e condenou os requerentes, solidariamente, ao pagamento de custas processuais, bem como honorários advocatícios, estes fixados em 14% do valor da causa, cuja exigibilidade foi suspensa em razão de os requerentes serem beneficiários da gratuidade judiciária.

 

Em suas razões recursais, os apelantes alegam que a conduta dos apelados desbordou o exercício regular da atividade profissional da advocacia, na medida em que eles, na condição de advogados, não se limitaram a narrar os fatos, mas, pelo contrário, emitiram juízo condenatório em desfavor dos recorrentes, ao mencionar que o pedido de abertura de procedimento investigatório se devia ao fato de que eles eram suspeitos da prática de crimes de quadrilha ou bando, estelionato, falsidade de documento e fraude processual. Diante disso, requerem a reforma da sentença, para julgar procedente o pedido de indenização por danos morais.

 

Nas contrarrazões, Lia Felberg, Rodrigo Felberg e João Marcos Gomes Cruz Silva pugnam pela manutenção da sentença.

 

É o relatório.

 

VOTO

 

DESEMBARGADOR ROWILSON TEIXEIRA

 

Estão presentes os pressupostos de admissibilidade, portanto conheço do recurso.

 

Extrai-se dos autos que os autores alegaram que o pedido de abertura de inquérito policial perante a autoridade policial de São Paulo/SP, realizado pelos requeridos, conteve abusos no exercício do direito, excessos, calúnias, difamações e injúrias contra todas as pessoas lá discriminadas - Família Mestou -, especialmente contra os requerentes, o que teria gerado abalos psíquicos e morais. Defendem que as acusações não condizem com a realidade e que não têm relação com o ocorrido.

 

Em virtude disso, requereram a condenação dos requeridos, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais na quantia de R$100.000,00 (cem mil reais) para cada requerente, em razão do pedido de abertura de inquérito policial, com excessos cometidos.

 

Lia Felberg, Rodrigo Felberg e João Marcos Gomes Cruz defendem a regularidade no exercício do direito e inexistência de atitude ilícita. Discorreram sobre imunidade constitucional do advogado e inexistência de dano moral.

 

Sobreveio sentença de improcedência ao fundamento de que inexistiram provas de que os apelados teriam agido com excessos em relação às manifestações no exercício da profissão.

 

Verifica-se, do conjunto probatório, que, desde o ano de 2008, membros da Família Mestou (Adbo Abdel Latif Mestou, Arcelina de Moura Mestou, Bassem de Moura Mestou, Ahmed Latif Mestou, Alan de Moura Mestou e Rana Hassan Mestou) pleitearam ações indenizatórias alegando ter contraído salmonelose no Líbano.

 

Observa-se, ainda, que os membros da referida família propuseram várias ações de indenização contra várias seguradoras, inclusive contra a empresa Coris Brasil S.A Turismo, Viagens e Assistência Internacional, que, diante da semelhança dos fatos e dos altos valores pleiteados, foi levada a investigar os fatos.

 

Consoante entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, a abertura de inquérito policial para investigar se determinado fato ocorreu, por si só, não é motivo para o reconhecimento de dano moral e condenação a esse título, pois constitui exercício regular de direito.

 

Nesse sentido, cito:

 

CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NOTÍCIA-CRIME PERANTE AUTORIDADE COMPETENTE, COM INDICAÇÃO DE SUSPEITO. PROCEDIMENTO CRIMINAL ARQUIVADO. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. AUSÊNCIA DE ABUSO DE DIREITO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A jurisprudência desta Corte considera que, em regra, a comunicação à autoridade policial de fato que, a princípio, configuraria crime ou o pedido de apuração de sua existência e autoria, suficientes a ensejar a abertura de inquérito policial, corresponde ao cumprimento de um dever legal e exercício regular de direito, não ensejando responsabilidade indenizatória o posterior malogro do procedimento criminal. Precedentes.

2. No caso, o Tribunal de Justiça foi categórico em reconhecer terem as apeladas, ora agravadas, agido no exercício regular de direito de apresentar notícia-crime perante a autoridade competente, não havendo falar em ato ilícito a ensejar a responsabilidade civil.

Incidência do óbice da Súmula 7/STJ.

3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.955.126/MG, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julg.14/2/2022, DJe de 24/2/2022. — g.n.)

 

Ademais, é importante destacar que os documentos produzidos pela citada empresa referentes à investigação do caso ocorrido no Líbano foram necessários para a abertura do inquérito policial e, posteriormente, ação penal no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (0003096-53.2012.8.26.0050), nos quais foram condenados pelo crime de estelionato, na modalidade fraude, para recebimento de indenização ou valor de seguro, o que demonstra que os apelantes, utilizando-se de documentos médicos falsos, agravavam as consequências das doenças de cada um deles, a fim de obter indenização de seguro. Inclusive, foi determinada a expedição de mandado de prisão contra os denunciados, cujo acórdão foi julgado em 22/2/2019, conforme id. 17853834.

 

Desse modo, verifica-se que os elementos constantes nos autos não se mostraram suficientes para corroborar as afirmações lançadas na inicial e muito menos na petição recursal, a ensejar o dever de indenizar dos apelados.

 

 Ante a ausência de comprovação de excessos quanto ao exercício regular de direito por parte dos apelados, ônus que competia aos apelantes, há que ser mantida a sentença de improcedência.

 

 Pelo exposto, nego provimento ao recurso. Majoro os honorários fixados na sentença de 14% para 16% sobre o valor da causa, como determina o art. 85, §11º, do CPC.

 

 É como voto.

 

EMENTA

 

 Apelação cível. Indenização. Responsabilidade civil. Instauração de inquérito civil. Dano moral. Ausência. Exercício regular do direito. 

 

Em regra, a comunicação de fato tido como criminoso às autoridades públicas, que enseje a abertura de inquérito civil, constitui exercício regular de direito.

 

Para configurar o dever indenizatório, é necessário que o réu tenha agido dolosa ou culposamente, de forma maliciosa ou, ao menos, sem observância do dever objetivo de cuidado.

 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Magistrados da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, em, RECURSO NÃO PROVIDO NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, À UNANIMIDADE.

Porto Velho, 02 de Maio de 2023 

Relator ROWILSON TEIXEIRA

RELATOR

Comentários

    Seja o primeiro a comentar

Envie seu Comentário

 
Winz

Envie Comentários utilizando sua conta do Facebook