Pesquisa financiada pelo Pro-Rondônia permite caracterizar hepatites virais dos tipos B e Delta

Uma pesquisa a respeito das hepatites tem revolucionado os estudos voltados à virologia

Texto: Gaia Bentes Fotos: José Gadelha
Publicada em 18 de julho de 2019 às 14:52
Pesquisa financiada pelo Pro-Rondônia permite caracterizar hepatites virais dos tipos B e Delta

O recurso previsto até 2020 para execução deve avaliar a hepatite Delta e hepatite B, dentro dos aspectos virológicos, imunológicos e genéticos, para definir a conduta e manejo mais adequados ao paciente

Uma pesquisa a respeito das hepatites tem revolucionado os estudos voltados à virologia. O projeto “Caracterização Molecular das Hepatites Virais na População Indígena, Amazônia Ocidental, Brasil” desenvolvido com fomento da Fundação de Amparo ao Desenvolvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e a Pesquisa (Fapero), por meio de recurso do Pro-Rondônia, permite enxergar as diversas vertentes da doença e seu comportamento na população indígena, visando identificar os motivos da grande incidência de hepatite na região norte do país.

Projeto liderado pela doutora em biologia e pesquisadora em saúde pública, Deusilene Souza Vieira Dallacqua, também responsável pelo Laboratório de Virologia Molecular e vice coordenadora de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz Rondônia (Fundação Oswaldo Cruz), está em desenvolvimento há aproximadamente 12 anos com a população indígena, com colaboração do doutor Juan Miguel Villalobos Salcedo, médico e pesquisador em Saúde Pública da Fiocruz RO, responsável pela equipe clínica do projeto. O trabalho com essa população iniciou no formato voluntário, com a colaboração do Distrito de Saúde Indígena (DSEI).

As coletas permitiram identificar a diferença das hepatites na população indígena e população geral, sendo dois tipos endêmicos na região, B e Delta, onde este segundo é muito agressivo na população geral, com evolução de cirrose e hepatocarcinoma celular. Na população indígena, observou-se comportamento diferente, sem evolução drástica, onde são difíceis os casos de evolução para fibrose ou hepatocarcinoma.

Segundo Deusilene, atualmente há 7,377 mil portadores crônicos cadastrados no Ambulatório de Hepatites Virais do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical (Cepem), alguns desses em acompanhamento ou tratamento dependendo da evolução da doença. Com isso, o estudo tornou-se um projeto de pesquisa, com aprovação do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) e Conselho Nacional de Ética e Pesquisa (Conep), e com submissão e aprovação no edital do Pro-Rondônia, para investimento de R$ 250 mil (pesquisa e bolsas para o pesquisador, via  Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes), recurso que contempla: projeto de doutorado que está avaliando a caracterização molecular da hepatite Delta em relação a carga viral, mutação, resistência e polimorfismo nessa população; trabalho de mestrado apresentando polimorfismos (alterações no gene da população indígena), que pode caracterizar um comportamento diferente dessa não evolução; bolsas para quatro alunos de iniciação científica, que trabalharam para amplificar o genoma completo do vírus Delta, avaliação de mutações e filogenia (origem do vírus); e um estudo epidemiológico, já publicado.

 

“Falamos de uma população vulnerável, que é a população indígena. Se não fosse esse edital do Pro-Rondônia, não conseguiríamos entender toda essa dinâmica do comportamento dessas hepatites dentro da população”, explica Deusilene.

 

O Pro-Rondônia possibilita o recurso para a pesquisa, chamado de custeio, e aos pesquisadores, as bolsas auxiliam na dedicação exclusiva e formação de profissionais.

O recurso previsto até 2020 para execução deve avaliar a hepatite Delta e hepatite B, dentro dos aspectos virológicos, imunológicos e genéticos, para definir a conduta e manejo mais adequados ao paciente. Com o objetivo de identificar como é a atuação dos tipos de vírus nos índios, a segunda etapa do projeto está sendo realizada também com a população geral, para comparar os dados e analisar uma mutação pontual ou alteração na população indígena, que podem ser diferentes da geral, e vice-versa. Segundo a pesquisadora, faz-se necessário caracterizar o comportamento diferenciado e tentar entender a endemicidade do Delta nessa região, identificando o porquê da hepatite confinada em Rondônia, Acre e parte do Amazonas.

Bolsistas contribuem com desenvolvimento da pesquisa junto à pesquisadora Deusilene, na Fiocruz RO

“Avaliamos algumas mutações e polimorfismos detectados, já sendo o diferencial, por não haver nenhum dado publicado até o momento. Até o final do ano teremos um artigo publicado a respeito desse assunto. Para complementar, hoje, dentro da rede pública, dentro do SUS (Sistema Único de Saúde), não é realizado (exame) carga viral para hepatite Delta. O acompanhamento desse paciente é baseado em alguns exames laboratoriais de rotina e na evolução clínica que é observada pelo médico ao longo do acompanhamento do paciente. Nós desenvolvemos e aprimoramos ao longo do tempo, um kit para desenvolvimento da quantificação das partículas virais circulando no sangue”, explicou Deusilene, onde a partir desse kit será possível definir se o paciente com hepatite tipo Delta tem carga viral, ou seja, quantas partículas virais este indivíduo tem detectado na amostra sanguínea, isso pode definir qual conduta será necessária para este paciente: tratamento ou acompanhamento.

O projeto estabeleceu parceria externa, com o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), com experiência em colocar produtos e kits no mercado. Os pesquisadores da Fiocruz estão aprimorando o kit com o objetivo final de distribuir para rede pública nacional, principalmente em áreas de alta endemicidade para esta doença.

Para avaliação da epidemiologia das hepatites virais na população indígena, o projeto contou com apoio do Programa de Pesquisa para o SUS (PPSUS) para conhecer os tipos e quantidades em diversas etnias. “Hoje, praticamente toda a população indígena acompanhada no projeto não precisa mais de tratamento, foram tratados e responderam positivamente. Desde 2013, com a resposta, a doença não evoluiu drasticamente para fibrose (perda ou falha do fígado) e câncer do fígado (hepatocarcinoma)”, garantiu Deusilene, acrescentando que os índios são acompanhados anualmente.

Com comportamento diferenciado da população indígena, os estudos complementam outros dados, como um projeto que está sendo desenvolvido para estudar hepatites em mamíferos, principalmente como os primatas, de forma a identificar a dinâmica do vírus nos animais e comparar com a população indígena e geral.

A formação de recursos humanos também é um diferencial do projeto, que conta com alunos de pós-graduação em nível de doutorado, mestrado e alunos de iniciação científica, incentivando a continuidade de sua formação, os qualificando para o trabalho dentro Estado. Além dos alunos, outros pesquisadores como os doutores Juan Miguel Villalobos Salcedo, Alcione de Oliveira dos Santos e Luan Felipo Botelho Souza, contribuem para os resultados que estão sendo obtidos. Um trabalho em conjunto com parceiros, possibilitando a expansão da informação e desenvolvimento de outras pesquisas.

Conforme afirmou a pesquisadora Deusilene, 80% dos projetos da Fiocruz são fomentados pela Fapero, por isso é fundamental o apoio financeiro que possibilita a pesquisa, com retorno e benefício para a sociedade. “Quando estudo hepatite também podemos falar de prevenção e orientação à população geral, evitando que outros peguem a doença”, finalizou.

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