Você já foi à Bahia? Torres foi

'O fato de não ter alcançado seu objetivo, não invalida o crime de atentar contra o pleito', diz a colunista Denise Assis em referência ao ex-ministro

Denise Assis
Publicada em 09 de maio de 2023 às 15:09
Você já foi à Bahia? Torres foi

Ministério da Justiça, Polícia Rodoviária Federal e Anderson Torres (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado | PRF | Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Você já foi à Bahia? Não? O ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, foi. No dia 24 de outubro de 2022, embarcou num voo da FAB, aquele, pago com o meu, o seu, o nosso rico dinheirinho, acompanhado do secretário-executivo do Ministério da Justiça, Antônio Lorenzo, do diretor-geral da Polícia Federal, Márcio Nunes, de um assessor especial do gabinete e dois agentes da PF, conforme documentos obtidos pela CNN.

O embarque se deu no Aeroporto Tom Jobim - o Galeão -, e duas horas depois eles já desembarcavam na Bahia. A viagem teve missão importante. Torres levava consigo um mapa das principais cidades do estado onde o agora presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia vencido no primeiro turno, cuidadosamente preparado pela auxiliar, a delegada e Diretora de Inteligência do MJ, Marília Alencar. (Não há confirmação de que ele soubesse do objetivo do levantamento). Mas sim, sabe-se agora, que o objetivo de sua ida à Bahia foi para se reunir com a Polícia Rodoviária de lá. Havia um pedido muito especial a ser feito: eles deveriam – tal como ocorreria em outros estados da região, fazer uma operação para bloquear os ônibus que levariam eleitores até as urnas, gratuitamente, conforme determinação da Justiça Eleitoral.

Para os investigadores da PF, que apuram essa viagem de Torres e suas consequências, o documento elaborado pela delegada Marília Alencar, então diretora de inteligência, serviu para que o ex-ministro colocasse em prática o plano para atrapalhar a votação e autorizou a operação da PRF.

Com um universo de 11.291.528 milhões de eleitores, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Bahia deu a Lula 69,49% dos votos válidos no primeiro turno. Por isto era fundamental a reunião, que transcorreu das 11h às 12h, do dia 25, da qual participaram, além de Torres e Almada, o secretário-executivo do MJ, o diretor-geral da Polícia Federal, e os delegados da PF na Bahia Marcelo Werner e Flávio Marcio Albergaria Silva. Não houve acordo para a participação da PRF da Bahia nas manobras golpistas de Torres, que voltou do encontro às 16h30, logo depois de recebido o “não”, no próprio dia 25. Tampouco se revelaram eficientes as investidas nos demais estados. O resultado em todo a região demonstra: Nordeste: 69,34% (Lula) x 30,66% (Bolsonaro).

O que se sabe é que, na operação, foram fiscalizados 2.185 ônibus no Nordeste, no dia 30 de outubro do ano passado, contra 632 na Região Sul, onde o candidato do PL venceu no primeiro turno.

Porém, o fato de não ter alcançado o seu objetivo, não invalida o crime de atentar contra o pleito, conspirando contra o seu resultado. Isto só agrava a situação de Torres perante a Justiça e desvenda um capítulo importante das sucessivas ações golpistas do entorno de Bolsonaro. A tal “margem apertada” obtida na vitória de Lula, hoje, tornou-se impalpável e indefinida. Difícil dizer quantos eleitores deixaram de chegar às urnas com os bloqueios impostos nas estradas de acesso às sessões de votação. O que temos de certo é que o cerco se fecha e a história, como um mosaico, vai sendo escrita.

Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar". É Integrante do Jornalistas pela Democracia.

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